quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

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Astuta. Ela me ouve reclamar de longe, e quando está à quilômetros daqui e sente a emoção taciturna que me eleva feliz pela sua ausência ou quando até mesmo fico triste e começo a chafurdar numa espécie de neve rarefeita, densa e enregelante ela atiça seus ouvidos, aguça seus sentidos e como um ladrão ela volta no meio da noite e me pega desprevenida.
   Não falarei mais dela. Dizem que quando tocamos de mais em certos assuntos eles se tornam mais reais e quanto menos falarmos sobre algo aquele algo desce a um esquecimento profundo, até não existir. Talvez esse seja meu remédio. Talvez seja tudo que eu mais precise.
    O silêncio absoluto que se transformará num oco recheado de histórias não contadas e sentimentos não vividos. A solidão, o deslocamento, e até mesmo outros sentimentos que muitas vezes ruins, pelos quais nos sentimos arrastar, virarão memória esquecida, só memória. Logo, não quero nem lembrar-me os nomes.

Annabel Laurino.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Dor, oh dor conhecida.

    Acho que a pior dor que pode ter é aquela que vem no final do dia. Não, não desvalorizo aqui o amontoado existencial de outras dores. Mas afirmo que a pior e mais conhecida é a que acompanha o crepúsculo estampado na janela aberta do quarto, que adentra amena como uma manancial fina e vem mansamente com suas sapatilhas de algodão. Depois do dia cheio, da tarde quente, das coisas loucas, dos inesperados das horas, da turbinação do sol, das peles, rostos, e temperaturas em alto grau você se joga na cama e olha para o celular. Meu Deus, a ultima pessoa que você acabou de falar era a pessoa que até então era a mais especial da sua vida e vocês acabaram de brigar. Ninguém até agora perguntou como foi o seu dia. A cabeça lateja, o café não resolve, o corpo rasteja, os olhos ardem, e por dentro tudo parece em cacos. Você até pensa se essa momentânea gripe de dor no corpo e nariz estranho não venha a ser uma forma de todas as coisas trancadas lá dentro estarem escapulindo para fora, fisicamente.
    Dói tanto se sentir tão só, é como querer água num deserto, os pés uns torrões de areia frita, a longitude imensa a sua frente, nem uma viva alma, e o sol acima torrando os miolos, tudo tão dolorido, só e tudo que você quer tão longe.
    Tudo que eu mais quero era um ligação, ou um abraço, ou um beijo terno no rosto, umas frases por mais clichês que fossem, um café feito, uma conversa construtiva, alguém que me ouvisse também, um colo, um afago no cabelo, e tudo ia ficar bem.
    As vezes parece que a gente entra para essa guerra só e sai só sem mais nem menos. Parece até que tem alguém que fica nos chutando pelas costas nos empurrando para seguir em frente mesmo que tudo pareça tão desesperador.
    Acho que posso estar só com medo, ou talvez arrependimentos. Não sei, é um misto de coisas. Só sei que meu telefone não toca, que ninguém liga, que meu velho amigo novamente me esqueceu. Fico tentada a procurar alguém, fico tentada e discar os números e sei lá, puxar conversa. Mas até isso se torna cansativo.
    É aquele velho sentimento de querer ser salvo, entende?


Annabel Laurino.

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Às vezes eu penso em desistir, eu acho que não agüento essa aprendizagem toda outra vez — fico tentado a desistir. Não sei bem por que insisto, posso dizer apenas frases feitas sobre isso, mas na verdade não sei.


(Caio Fernando Abreu)

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

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Alguém me perguntou se eu conhecia você, um milhão de memórias passaram pela minha mente e eu sussurrei: não mais.






Caio Fernando Abreu



sábado, 25 de fevereiro de 2012

L'Amour


L'amour, hum hum, j'en veux pas
J'préfère de temps en temps
Je préfère le goût du vent
Le goût étrange et doux de la peau de mes amants,
Mais l'amour, hum hum, pas vraiment !


Carla Bruni

!

Tô cansado de tanta babaquice, tanta caretice
Desta eterna falta do que falar









Cazuza

Nebulosamente fria e dura, só, sempre só

    Começo clara como água cristalina. Em parte, por que as vezes é preferível enfiar a ponta da adaga rápida do que prolongar lentamente, rasgando a pele aos poucos em uma dor agonizante e lenta, lenta e agonizante. Digo logo, não sei o que faço aqui e nem o que sinto.
    Isso se torna um tudo muito falso e simplificado. Porém real, porém lucido.
    As vezes você não prefere que seja assim?
    Penso que a dor não sai mais daqui, parece como uma companhia bruta, quase carnal, parece que se aloja de tal modo ao meu lado que está sempre acorrentada a mim, e anda comigo por todas as partes e quartos da casa, nas ruas também. E quando estou acompanhada ela parece ainda mais viva, puxando-me os cabelos, baforando nuvens densas de suas chamas quentes em minha face, gargalhando das minhas tentativas inúteis para não me sentir tão só. Sempre querendo que eu me sinta estupida. E sempre conseguindo. Me pegando em flagra como uma criança no meio da noite abrindo a gaveta de chocolates e sendo pega pelo pai.
    Fico repetindo que tudo isso tem que passar, é só uma entrada de dor passageira, passa, passa. Mas ela persiste tanto e tanto. Cada vez me sinto mais só, soterrada em coisas só minhas, e são tantas, tão pesadas, e que ninguém quer saber, que me sinto afundar.
    Eu não aguento mais cuidar de ninguém. Não me leve a mal, mas já servi tanto de cobertor para noites frias, remédio para dores incuráveis, sol para noites chuvosas, corpo quente para vidas solitárias. Não aguento mais consertar pessoas, servir de ponte para realidades objetivas, não consigo, não funciona, não tenho mais forças.
    Eu só queria uma unica vez que alguém chegasse e colocasse-me sobre o colo, acariciasse meus cabelos sem  palavra alguma, essa pessoa escutaria todas as minhas dores, da mais fúteis até aquelas que nunca foram contadas a ninguém, mesmo nos momentos mais desesperadores. Então eu que seria carregada, consertada, que teria as feridas curadas, o peito frio aquecido, as lágrimas secas, o corpo são e a mente viva. Seria uma unica vez eu a salva, eu a resgatada.
    Como dizia o Caio, chega de me doar, chega de me doer.
    E de tanto arrastar-me nessa busca incansável é que a dor persiste, e vejo sempre com muito peso que estou sempre só.
    Quase sempre sozinha no quarto, escutando uma musica velha, escrevendo categoricamente, penso no passado, penso naquele alguém que de certo nem pensa mais em mim e penso no quanto eu tive a oportunidade de não ter curado, mas ter sido curada e me neguei. A mim, a nós. A tudo.
    Erros cruéis.
    Digo a mim mesma, menina passado não se tira pó, se joga na gaveta. Começo andando em frente, mas vou dizer que ta difícil.
    E é assim que encerro as águas, cesso as ondas, seco as lágrimas, engulo o desabafo, finjo que nenhuma tormenta nebulosa veio me visitar, saio daqui, me jogo sobre a cama e penso e repenso na vida, dando voltas em um circulo sem saída.
   Tão difícil.Tão, tão...


Annabel Laurino.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

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Imagina só acordar todos os dias as sete da manhã, lavar o rosto em água quente e depois em água fria, passar todos aqueles cremes faciais, dentais, enxaguantes e etc. Pentear os cabelos coloridos de vermelho, sorrir falsamente para o espelho, tomar os primeiros 500ml de água dos 2l do dia, comer frutas, uma das sete do dia. Criar uma tabela organizada, as oito e meia sair de casa calçando seus melhores tênis de corrida e correr um perímetro longo e exaustante, voltar para casa depois de ter pego no minimo 15 minutos de um sol matinal leve e gostoso, tomar um banho e seguir os dias em dietas, leituras introspectivas de Clarice Lispector à Caio Fernando Abreu, livros de fantasias, aventuras e romances. Escrever todos os dias milhares de capítulos para seus próprios livros sempre quando a noitinha estiver caindo no céu, quando o sol estiver indo embora, e você escutar uma musica de inspiração grilar nos ouvidos bem baixinho. Imagine só, se ver tão saudável, a pele clarinha, os olhos luzidios de um brilho são, expressando uma mensagem clara daqueles que sobrevivem as guerras cotidianas. Alegre, olha no calendário, os dias passam rápidos. Um dia, e depois outro e outro. Um de cada vez. Respira fundo se sentindo viva, saudável, de bem com o universo, um tanto só, um tanto esquecida, porém viva, porém feliz.

Annabel Laurino.

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 Tirei uns dias pra me despreocupar de tudo. Da rotina, das pessoas, do que me fazia mal e do que não fazia diferença na minha vida. E assim fui, esqueci de tudo por um dia e vi que é melhor viver assim.

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Se implorar resolvesse, não me importaria. De joelhos, no milho, em espinhos, agachada, com o cofrinho aparecendo. Uma loucura qualquer, se ajudasse, eu faria com o maior prazer. Do ridículo ao medo: pularia pelada de bungee jump. Chorar, se desse resultado, eu acabaria com a seca de qualquer Estado, de qualquer espírito. Mas amor não se pede, imagine só.

— Tati Bernardi. 

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Sabe quando parece que nada da certo pra você? Quando o mundo se torna o pior lugar do mundo pra estar. Parece que ninguém te entende, parece que ninguém te ouve. Só que você continua quieto, calado, mesmo quando seu coração parece gritar por socorro. Tudo continua, as semanas são as mesmas, só que você para de acreditar em contos de fadas, começa a perceber que aquilo tudo que você sempre sonhou não passa de uma palhaçada. É triste ter que mudar por obrigação, aquela criança que vivia sorrindo cheia de alegria do nada se tranca no quarto. Pior que ela nem sabe o porque… Talvez esteja precisando de tempo mesmo. Quando você esta sozinha você pensa muito nas coisas, só que não sabe o que é, não sabe o que fazer. Pior pensa que não sabe de nada.

— Desventuras Em Serie

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Chega de me doar, chega de me doer. 


Caio Fernando Abreu

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Tão dificil deixar fluir. (..) Mas é o que precisa ser feito agora. Virar barquinho, mesmo. Relaxar e observar o caminho, a paisagem. E assim vamos fluindo. Correnteza leve, por favor. Que não estamos assim muito prontos pra grandes tormentas. Tá tudo bem na verdade. 






CFA 

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

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"Eu sou à esquerda de quem entra. E estremece em mim o mundo. (...) Sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes que aqui caleidoscopicamente registro. Sou um coração batendo no mundo."

(Clarice Lispector)

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Perene meu caro, perene


    Estou escrevendo isso não por obrigação, mas pelo que parece eu não consigo pensar em outra coisa que não seja, bem, em você.
    É verdade, não fique surpreso. Não faça essa cara de bobo como se recém descobrisse que o assoalho da sala é verde limão. Estou falando sério. Mais sério do que nunca, e isso é grave. Não estou acostumada em ser direta em assuntos... Bem, delicados? É, delicados. Não estou acostumada. E isso, sugiro assim, dói um tanto como certo tipo de incomodo necessário, quando a gente sabe que tem que tomar uma injeção para ficar curado mais rápido e que logo quando toma, passa, e vem o alivio e a cura.
    Tudo isso que estou escrevendo virá a ser uma espécie de cura.
    Acredite, eu estou tão mais surpresa que você.
     Por que eu estou escrevendo? Eu não sei. Difícil dizer. O problema mesmo é que sempre quando falo, quando olho nos seus olhos tocando nesses assuntos tão... Novamente delicados, eu fico nervosa, gaguejo, olho para os lados e procuro direções completamente opostas do que eu realmente queria dizer.
    Você precisa acreditar em mim, tudo isso é um baque fechado para mim, e pode ser que venha a ser para você também.
    Li uma vez, Pequeno Príncipe, se você quer saber, “Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas”, dizendo isso uma raposa.
    Eu sou a raposa e digo isso a você. Você é responsável pelo que fez em mim. E digo, eternamente responsável.
    Você me cativou surpreendemente fácil e sem dor. Como conseguisses? Não compreendo nem mesmo agora, depois de ter pensado para só então dar partida nessa estonteante escrita. Mas sugiro que devem ter sido seus gestos cavalheirescos, suas atenções dadas ao que eu dizia, seu carinho, seu amor, sua forma doce, protetora, prestativa, gentil, me acolhendo, me dando forças.
    Você me conquistou nos detalhes e nem percebeu, acho que passou batido não sei. Toda vez que olho para o futuro eu consigo lhe ver nele facilmente, lucidamente, fácil, sereno, quero levar você para todos os anos da minha vida. Quero estar do seu lado quando meus livros forem publicados, quero poder escrever histórias de personagens incríveis e neles usar suas piadas, quero me inspirar, sugar você, quero você e isso é uma coisa que me atordoa.
    Quero que você esteja aqui em todos os dias de inverno, e quero cuidar de você, mudar você de uma forma que no fundo já és, mas que me deixes aprofundar nesse gesso duro que criasses em volta de si, completamente desnecessário, ao longo dos anos. Eu só quero, sarar suas feridas, quero ser seu bem, quero sem pretensão de rótulos, poder estar, simplesmente, estar com você, em você.
    Você compreende?
    O problema, que não é novidade, é que tenho muito medo de tudo. Talvez um medo aterrorizante do amor que você sente por mim, e tenho medo de mim, e da minha capacidade insana de fugir quando as coisas ficam sérias. Eu sou lupina, não gosto, mas sou. Chamo-me assim, por gentil. Só por isso. Mas falo sério, tenho medo. Desse medo que me arrasta no incerto, me prende e quase me sinto sufocar, tenho medo de perder o fio da coisa, de ser deixada, de você me deixar, de sei lá, estragar tudo, tenho medo de como pode ser.
    Tenho medo de me machucar.
    E olho para você, se machucando esse tempo todo por mim. Minha nossa, como você consegue?
    Eu sou tola, evasiva e fria.
    Como pode?
    Não consigo entender.
    Sinto muitíssimo, a coisa toda termina logo nas linhas adiantes eu quase nem tenho muito mais o que escrever por que simplesmente me deu uma sede de te encontrar e dizer tudo cara a cara.
    Então acho que vou encerrar por aqui, beber mais café e ver se você me liga daqui a pouco, vou sentar na cama e terminar de ler aquele romance que estou lendo, vou lembrar de você no decorrer das páginas e vou pensar se estou bem certa disso. Não terei respostas, quase nunca temos. É impossível ter. Mas é isso, eu precisava disso, eu precisava escrever sobre isso, e isso. Eu só precisava. Sei que você entende.
    Você sempre me entende.

Annabel Laurino. 

Retido

Não deixe eu me reter, não deixe eu fugir, me prenda, me puxe, me grite. Grite meu nome, diga tudo, mas não deixe. Não quero reter, congelar, ficar fria e dura, parada para sempre aqui nesse lugar vendo você ir sempre e sempre sem dizer que o que eu quero realmente dizer. Então, não me deixe reter, ficar retida, morrer para dentro. Por favor, não deixe. Faça alguma coisa.
    Eu sei que saco, sempre faço isso, mas não deixe. Escute, não deixe.




annabellaurino

Halianto esfumaçado.

Rói o canto da pele no minusculo dedo indicador. Bebe água. Rói a pele. Puxa e puxa, até arrancar. Observa o estrago. Sangra. Mas não dói. Engraçado. Quando na vida algo sangra e não dói? Bebe água, chupa o dedo, olha para a tela de luz a sua frente, vazia, o documento vazio, as ideias não vem, dor, a droga do travamento de criatividade. Esquece a água, bebe café. Só café agora, até as drogas de ideias virem. Começa a escrever coisas sem sentido. Se pelo menos tudo na vida fosse um tanto mais simples do que essa droga toda. Droga, não tem outra coisa pra falar então só pensa em droga. É tudo tão... droga. Poxa, mas que droga, por que dessa droga? Volta para o dedo, puxa só mais um pouco a pele e agora dói, arde e arde, volta a chupar o dedo, que droga. Volta a pensar que se as coisas fossem mais simples, se pelo menos os pensamentos na cabeça funcionassem como um trem deslizando sobre um trilho, feliz, partindo em meio aos campos de girassol com um sol forte perfurando a fumaça, o barulho do ferro sendo batido contra o ferro, as engrenagens trabalhando perfeitamente, uma brisa quente soa leve do alto das montanhas lá longe e escorrega devagarzinho como uma gelatina densa se espalhando pela colher e vai descendo e condensando no ar até bater nas janelas fechadas, perfurar adentro pelas janelas abertas e acertar os rostos corados do sol forte, apagar os cigarros, esfriar os cafés, e vai indo, condensando toda a coisa. Indo lentamente. Acerta o rosto, paira no ar, entra no ralo de luz, misturando. Você já pode sentir. tem cheiro de halianto sobre o sol. Sim, sim. Bebe café, mais café. Hum, nhám, é. Sim. Sim. Já consegue sentir.


Annabel Laurino.

Citando-ando

- Citações, citações e mais citações, você não cansa?
- Não, não se elas fazem um completo sentido espelhado e profundo.
- Não entendo muito bem...
- Tanto faz. Nem eu.
   (E da de ombros, ambos os dois)

Annabel Laurino.

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"Desfiou a barra mal costurada em seu coração. Desfiou e retirou dali cada ponto grosseiro, desalinhado, assimétrico que tinha feito. Era tanto desencanto para desfiar que ali passou por três dias sem mais nada fazer... E sorriu (nada mais lhe parecia certo naquele momento). Costurou então seu coração com palavras macias, gracejos, carinho na ponta dos dedos do pé, beijos na nuca, mãos que circundavam a cintura, com as canções mais bonitas, meias listradas. O seu coração então encheu-se de cor..."


(Caio Fernando Abreu)

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

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"Eu vou embora sozinha. Eu tenho um sonho, eu tenho um destino, e se bater o carro e arrebentar a cara toda saindo daqui, continua tudo certo. Fora da roda, montada na minha loucura. Dá minha jaqueta, boy, que faz um puta frio lá fora e quando chega essa hora da noite eu me desencanto. Viro outra vez aquilo que sou todo dia, fechada sozinha perdida no meu quarto, longe da roda e de tudo: uma criança assustada."

Caio Fernando Abreu 

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

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"Eles falavam muito pouco do que sentiam um pelo outro: não havia necessidade de frases bonitas e pequenas atenções entre amigos tão experientes." 




Thomas Hardy 

domingo, 19 de fevereiro de 2012

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You make me wanna spread my arms and fly! 

Desbotando até o som que mudo grita sem cor. Sem cor.

    Os dias parecem tão pesados. Parecem que chegam sempre se arrastando tendenciosamente, sempre lúridos de mais. E quando chegam, chegam quentes, com o ar fechado, me sufocando, colocando-me no tédio profundo, na falta do que ver, quem ver, falar o que, com quem falar.
    Os cafés, ah sim, os cafés escorrem quentes de mais na garganta teimosa. As gotas de umidade escorrendo pelas paredes da minha pequena caixa. Lembram-se? É assim que o chamo.
    Há uma amargura nos olhos cansados, uma sonolência grande e gorda, o arrependimento sempre tão presente, o peso, a angustia, a raiva de si mesmo, a vontade louca de chorar e não parar mais, de encostar o rosto em algum ombro confortável e acarretar todos os acontecimentos fáticos da caminhada, esquecer o orgulho, engolir o medo, a vergonha.
    Vergonha. Os dias passam e ela vive estampada na cara como se fosse uma espécie de adesivo com cola Super Bonder.
    E para não falar nas pessoas. Ah as pessoas! Como me canso delas. Sempre tão pretensiosas, chatas, vazias, sem risos verdadeiros ou mentes trabalhando direito, parecem quase sempre incompletas e tão cansativas. Nos últimos dias falar com plantas tornou-se um novo projeto em mente, sugiro que a minha relação com a fotossíntese possa ser um tanto mais química do que essa que venho levando com as pessoas. E falo sério. Me entristeço quase todos os dias. Sei que já disse isso antes, posso até estar parecendo um tanto mais repetitiva do que possa parecer ser, mas na verdade, e que é uma verdade todos sabem, ninguém entende ninguém, é possível que se compreenda. Afinal, ninguém esta na pele do outro para sentir a tamanha dor, angustia ou tristeza transcorrida, não é mesmo? Se imaginar estar no lugar do outro é diferente, possível, mas é um ângulo muito diferente de ver as coisas.
    E vou ter que falar como nos últimos dias bateu uma tristeza dessa verdade absurda. Da um desespero, uma incapacidade, uma falta de ânimo, uma falta de ver e ouvir e ler qualquer coisa. Tenho vontade de armar uma barraca no quintal de casa, morar lá para sempre, fazer companhia para as pombas e passarinhos, me alimentar de vegetais e hortaliças, fazer café em bule de ferro batido, deixar o cabelo crescer até os quadris, não ter mais qualquer relação com o mundo exterior.
    Falo sério, embora pareça loucura.
    Qualquer coisa, eu repito, qualquer coisa, uma saída, uma conversa, um sussurro, um carinho, um “eu sei o que você ta passando, vai passar, você é capaz”, um ouvinte, uma forma que não doesse, não cobrasse, que sarasse. Mesmo que a cura durasse dois minutos e meios, mais seriam dois minutos e meios depois de dias se sentindo tão só.
    Estou começando a achar que posso até enlouquecer. Esse morno quase morto, essa falta de marés altas vem afundando tanto. Não quero mais ouvir falar do quanto foi e sou burra e do que devo ou não fazer.
    A vida parece tão dura, tão desesperadora.
    Fico procurando nos retalhos dessa colcha colorida e descolorida um retalho salva vidas que possa me socorrer, como abrigo, como manto para aquecer, não tem importância, mas algo de verdade. De verdade.
    De verdade.


Annabel Laurino.  

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Gesticulando fios de luz, amanhecendo como se não houvesse amanhecer

    Acordei seis horas da manhã como se seis horas da manhã nunca tivessem existido.
    Fiquei olhando para o céu, através das frestas da janela do quarto, cinza escuro que foi clareando ao poucos com a chegada do sol.
    Parecia que não havia dormido nada e continuou parecendo mesmo depois de ter bebido café e visto os ponteiros do relógio chegarem se arrastanto até as nove da manhã.
    Estou mais certa do que nunca que escrever utiliza uma grande e imensa e desfavoravel e revigorante, porém quase insignificante, se você quer saber, força de vontade. Brutal. Estou mais certa disso agora, já que acordei com o olho direito meio inchado, como se tivesse cheio de areia, levado um soco, respingado de limão, sido beliscado e todas as atrocidades que você quiser pensar que possa recriar uma cena bem idiota, e que eu com essa lentidão toda me recuso a pensar, e que resulte num olho feio e machucado.
    Mesmo assim me obrigo a estar aqui agora parafraseando tudo isso como se fosse uma incrivel aventura de acordar, beber café, mosquiar dormente vendo as horas passarem e depois anotar tudo isso como se Peter Pan tivesse me visitado ou eu tivesse entrado por um buraco mágico até o País das Maravilhas.
    Não sei, acordei com uma sensação estranha. Como se tivesse muitas coisas retidas dentro de mim, talvez seja esse livro comovente que ando lendo, talvez seja essa áurea auspiciosa que me toca lentamente com as suas mãos brancas e frias, e me tomando, me engolindo, me fazendo rever milhares de valores e acertos, que antes eu havia decretado como encerrados.
    Não é estranho como o dia as vezes amanhece e parece que muda tudo a sua volta muito rápido, como num piscar de olhos?
    Estou tentando pensar direito, mas acho que a minha mente oscila entre o incomparável e detestavel sono e preguiça.
    Daqui a pouco estarei saindo de um banho gelado, entrando dentro de roupas macias e finas e perambulando pelo centro da cidade com um óculos imenso de sol no rosto, um olho direito machucado e milhares de pensamentos sonolentos e contraditórios no bolso.
   Tudo bem, ta tudo bem, talvez seja o efeito do sol, do dia, do calor, do café, da preguiça, do sono, da lentidão, da falta de vento, ou do livro até mesmo. Não sei.
    E acho que nem quero descobrir.



Annabel Laurino.

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Mas na maior parte do tempo se sente como uma personagem de um romance de Muried Spark - independente, aficionada por livros, inteligente e secretamente romântica. 




(Um dia - David Nicholls) 

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

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   Dentro de mim há uma sede amarga e dolorosa, porém, precisa. Ela dita assim: "Agora."




 Annabel Laurino.

Rarefeito, perfeito

    Hoje o mundo pareceu encoberto por uma camada fina, quente, espaçosa.
    Pareceu um tanto quanto rarefeito.
    Ele disse assim: - Eu estou amando como você sorri.
    Nunca tinha ouvido dizer assim, como se a pessoa estivesse aos poucos amando cada coisa da outra pessoa. E entendi que não se ama por conjunto, inteiro, tão de repente. Se ama aos poucos. É como se para gostar de um edifício inteiro, você tivesse que gostar de cada tijolinho da obra, cada detalhe auspicioso das janelas, portas, corrimãos de entrada, etc. e afins.
    Ele, com suas sobrancelhas grossas e olhos firmes concluiu assim: Não, não só isso. Acho que estou amando simplesmente tudo em você. Sabe, é, a forma como você levanta o cenho quando fica desconfiada ou como caminha, como se não fosse dessa época, ou nem desse planeta. Como se não existisse. Sei lá. Eu amo tudo.
    Ficou tudo mais absolto, o que geralmente costumamos chamar, silêncio. As vertigens nervosas do estomago tremeram, a casa que sustenta a gente e a lareira em chamas começou a incendiar. Faces rubras e febris.
     Depois veio as ondas, o aconchego dos braços e o mundo começou a ficar rarefeito/perfeito, quase isso, só para não estragar. O sol indo embora, disse ele: Lá se vai Apolo, logo vem Ártemis.
    Era verdade, o sol vermelho dando adeus, brilhava como uma bola de fogo no final do dia, era como um rosa avermelhado lá longe, no horizonte. A areia encobrida de cinza arroxeado.
    Perguntei-me: Quando foi mesmo que você passou a gostar tanto de praia?
    Olhei para o lado. Sobrancelhas grossas, olhos firmes, "Eu amo tudo".
    Ah sim... Acho que não importa.


Annabel Laurino.

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Foi então que eu descobri. Ele está exatamente no mesmo lugar que eu agora, pensando as mesmas coisas, com preguiça de ir nos mesmos lugares furados e ver gente boba, com a mesma dúvida entre arriscar mais uma vez e voltar pra casa vazio ou continuar embaixo do edredom lendo mais algumas páginas do seu mundo perfeito.
A verdade é que as pessoas de verdade estão em casa. Não é triste pensar que quanto mais interessante uma pessoa é, menor a chance de você vê-la andando por aí?"

Tati Bernardi

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"Foi bom demais te conhecer. Me deu uma fé, uma energia. Sei lá."



  Caio Fernando Abreu




quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Relatividade pura

    É tudo relativamente simples, raso, cristalino e puro. Mesmo que o cristalino as vezes possa parecer um tanto cortante, eu afirmo, é limpo e seguro como uma boia salva-vidas. O único perigo é relativo, pode furar, pode não servir direito, você pode até não conseguir alcança-la etc. etc. etc. Relativo.
   Sou assim, relativamente estável. Relativamente tendenciosa. Oscilo entre o bom, feliz e fechado. Fechada para mim, para você. E depende se você sabe aproveitar os momentos em que me abro, em que me descubro das faces serradas e sem emoção. Sou sensível, acredite. Choro por coisas minimas, sou capaz de tirar as roupas do meu próprio corpo e dar para quem precisa, fico horas no telefone chorando sem que seja eu que chore mesmo, carrego dores que não são minhas, carrego fardos que também estão longe de ser meus. Não me acho melhor por qualquer destas coisas. Talvez, algumas delas tenham até me trazido muitas destas feridas. E é sempre assim, falo sério, basta abrir uma simples e insignificante pétala que então, alguém resolve arranca-la. Não aproveitam meus sorrisos, não aproveitam meu lado bom. 
   Decido sempre, vou ser assim, é melhor mesmo. 
   Mesmo que quase sempre canse profundamente. Mesmo que de vontade de não ser. 
   Repito: É melhor, é melhor.


Annabel Laurino. 

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

não sabendo como, só sendo.

   Todo mundo se sente só. Acho que a solidão é o mal do século. Fome, de comida que não está nas prateleiras do mercado. Fome, que amarga, arranha na garganta seca e dói nos braços vazios de corpo quente para se abraçar no cair da noite. Solidão, falta de dizer e de ouvir: "estou aqui, sozinho, não estás.", beijo sobre a mão, carinho nos lábios. Tudo faz falta.
    As vezes, até mesmo, que por se diga assim, se sente fome, e saudade, e a solidão assoma tanto, que forte e densa, ela preenche o espaço do vazio, e tão grande e gorda, machuca, dói, não há o que fazer.
    Por que te sentes só? Ninguém sabe dizer.
    Como dizia Clarice, é uma verdade que todos nós somos um pouco triste e nos sentimos um pouco só. É fato exorbitante.
    E o que há de se fazer? Não sei. Desculpe-me, não sei. Se quer mesmo saber, prefiro essa solidão danada do que me escorar em qualquer corpo por ai, procurando abrigo, e mesmo assim, no fundo, ter por dentro, aquela terrível verdade aguda de que de qualquer modo continuo só, por que não é quem quero, quem mata a minha solidão, quem desfere a golpes essa tristeza.
    Não sei, cada um faz o que pode, como pode. Tem gente que não liga, tem gente que chora, que grita. Não sei. Acho tudo muito tristemente cansativo.
    Eis que engulo a verdade, aceito o fardo.
    Somos todos muito só.

Annabel Laurino.

Aproxima-se manso, dizia-se assim: Aos poucos, se chega lá.

    Não é estranho como os dias passam rápido? Dispersos, eles voam com pressa nos quadradinhos do calendário de papel da cozinha. Cada dia quente de verão, eles vão indo, como que fugindo. E eu olho, um quadrado a menos, a cada dia, um dia a menos de verão.
    Parece besteira, mas sonho com o inverno. Parece que esse corpo aqui só se sente bem no frio, no frio enregelante, nas tardes úmidas, nos espasmos românticos de um inverno muito bem dotado, por baixo daquela tão linda camada de folhas secas, dos cafés quentes, dos beijos gelados, os narizes vermelhos.
    Será que nunca me canso? Pergunto-me. Porém decido sempre que não. Expectativa furiosa que assoma lenta o fundo do estomago. Espero por dias melhores, espero por dias mais secos, mais úmidos, dias com mais sentido, dias mais sentidos. Espero por mais café quente em cima da mesa, por mão em cima da perna, em cima de outra mão, beijo por cima da mão, em cima do beijo, de outro beijo. Prossegue então, alivio, sinto alivio.
    Os dias voam, o logo se aproxima manso, porém ele chega.


Annabel Laurino.

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 I'm a Lady. 

domingo, 12 de fevereiro de 2012

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"Quando me entrego, me atiro. Mas quando recuo, não volto mais." 

(Clarice Lispector)

sábado, 11 de fevereiro de 2012

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"Inútil querer me classificar,eu simplesmente escapulo não deixando. Gênero não me pega mais."

     (Clarice Lispector)

Para-fraseando, ceando, ando, andando, indo

Não eu não acho que você tenha permissão para arrombar aqui o meu espaço. Para me fazer perguntas, para me exigir respostas. Não, quando eu não tenho resposta alguma. Não, quando eu sou a própria pergunta em ser vivente retorcido cujo ao ponto se desvira à curva no ar e retoca firme ao fim de um ponto. Sou a interrogação em pessoa. As perguntas movem o mundo. Eu movo o mundo. Eu movo, me movo, movo você. Você move? Move o que? Move somente ou também move, como comove. Comove quem? Você?

Annabel Laurino

NEW YORK, NEW YORK


Start spreading the news
I'm leaving today
I want to be a part of it
New York, New York

These vagabond shoes
Are longing to stray
Right through the very heart of it
New York, New York

I wanna wake up in a city
That doesn't sleep
And find I'm king of the hill
Top of the heap

These little town blues
Are melting a way
I'll make a brand-new start of it
In old New York

If I can make it there
I'll make it anywhere
It's up to you
New York, New York

New York, New York
I want to wake up
In a city that never sleeps
And find I'm a number one, top of the list
King of the hill, a number one

And... if I can make it there
I'm gonna make it anywhere
It's up to you
New York, New York

  - Frank Sinatra



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O importante, o irreversível, o definitivo, o claro nessa história toda é que eu gosto muito de ti. Muito mesmo. Não adoro, nem venero, mas gosto na medida sadia e humana em que uma pessoa pode gostar de outra. O resto é detalhe.


(Caio Fernando Abreu)


domingo, 5 de fevereiro de 2012

Opostos, Compostos.

 Ela escuta Nirvana, ele escuta Projota.
 Ela lê livros, ele joga The Sims.
 Ela não fala palavrão, ele fala.
 Ela é romântica, ele é carnal.
 Ela sonha, ele inventa.
 Ela estuda inglês, ele sabe sobre informática.
 Ela usa óculos, ele também.
 Ela escreve, ele digita.
 Nada superficial e nem a fundo.
 Apenas uma reentrância da contrastes
 Que por alguma explicação
 Se unem.

Annabel Laurino.

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Olho pra gente, meses atrás, sorrindo em fotos e vejo hoje, depois de milhares de pratos quebrados, móveis jogados pela janela, fotos queimadas e cartas rasgadas, não é muito lindo o que construímos até aqui?


Annabel Laurino.


Qual será a mágica que usas?


    E o que dizer? Você esteve aqui. A linha tele eletrônica que nos uniu por sons da voz, mesmo assim, pareceu algo tão próximo do físico que eu  até te senti aqui. Sentado ao meu lado, olhando nos meus olhos, tirando um peso imenso e perdurável de dentro de mim. Me senti tão bem, de repente bateu aquela paz, aquele riso no rosto veio tão manso e tão bonito que nem parecia mais eu, desde alguns minutos atrás.
    Que mágica é essa que usas sobre mim? Por acaso da tua boca saem fios de luz que me puxam como um solavanco, imperceptíveis fios, sem eu perceber? Ou será que nesse seu coração escondes de mim algum segredo bom, que por medo não me contas, mas desfrutas bem nas entrelinhas jogadas à pontinha de tua língua enquanto falas mansamente comigo, sobre mim?
    Não sei. Mas é muito bom te ter aqui, assim. E lindo me são os sorrisos que me vem quando me deixas nova, semeando em mim sementes de calma e paz. Eu digo, não vá nunca mais, fique aqui, não é lindo o que somos e o que seremos um dia?

    Annabel Laurino.

sábado, 4 de fevereiro de 2012

é.


    Vasculhando um espaço dentre a tampa do pote de água que preenche lívido o vasto novo dia que amanhece sozinho, preguiçosamente deleitando-se na janela do meu quarto. Atirando-se sobre as almofadas de corpos vazios como vasos cheios de teias de aranha, poeira negra, crosta suja. Cansaço profundo. Falta. Sinto uma falta e não sei bem do que. Alguém me diz?
    São quatro da manhã. Quem disse que trabalho de escritor é mole, esta enganado. Meu amigo, é doloroso. Depois que você se entrega para essa vida, parece que não pode mais sair. Não tem como ir dormir, não da. As idéias ficam titubeando na mente como uma goteira num canto sorrateiro da casa. E de pingo em pingo vai incomodando a gente. Então eu levanto, tomo aquele café, prendo o cabelo, e vou sangrando os dedos nas margens de linhas dolorosas que vão esculpindo uma vida muito longe de ser a minha. Pinto um cenário, invento, uso a mente, choro junto, sorrio, acho graça e depois parece que um vácuo vai me sugando aos poucos. E quando acaba? Quando acaba rastejo até a cama e me jogo.
    Sinto falta de um braço quente envolto do meu corpo pequeno, acariciando minhas dobras, moldando gentil nas minhas curvas. Sinto falta de alguém sentado a minha frente, completo e total disposto a ouvir e entender todas as minhas idéias mais insanas. Mas, vou te contar que ta difícil ein. Parece que essa corrida contra a dor não tem fim. A saudade de coisas não para nunca. Lembro de pessoas que de certo nem lembram mais de mim. E é duro, sabe? Da uma vontade de voltar no tempo, de forma que se fosse possível eu até me jogava dentro de uma janela mágica, recém programa para dois anos atrás. Pronto. Eu estaria plena e lívida. Mas, pensando bem, talvez não. Eu gosto muito do que eu sou agora. Só não gosto muito de como eu fui ficar tão só. Daquele tipo de solidão que é por minha livre escolha. Eu escolhi essa solidão. Eu sei que vivo melhor assim. Me conheço também. Sei o quão destrutiva eu acabo sendo quando tenho alguém.
    Vezequando é bom beijar na boca de um desconhecido, bonito, nunca vi, nem ouvi falar, dou meu número de telefone errado, digo até logo e vou embora. Não me leve a mal, não sou promiscua. Porém, não sei, tem um cimento aqui dentro. Acho que me dediquei a uma vida que não é minha por tempo de mais. Acho que agora a realidade é um véu que eu só enxergo por trás deste. Enquanto todas as pessoas não, enxergam apenas o que vem.
    Tudo bem, faz parte. Um dia a gente se acostuma.




Annabel Laurino.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

FIXING A HOLE


Estou consertando um buraco onde a chuva entra
E bloqueia minha mente de viajar
Onde ela irá.
Estou fechando as rachaduras que apareceram pela porta
E bloquearam minha mente de viajar
Onde ela irá
Estou pintando um quarto de uma maneira colorida
E quando a minha mente está viajando
Lá eu irei
Estou tirando o tempo para um monte de coisas
Que não eram importantes ontem
E eu ainda vou
Estou consertando um buraco onde a chuva entra
E bloqueia minha mente de viajar
Onde ela irá


The Beatles 

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"Daqui a pouco tudo vai ser passado mesmo. Deixa o vento soprar... Let it be."


Caio Fernando Abreu

Alvo

    O amor? O amor é traiçoeiro menino. Pior que veneno, pior que qualquer chama ou brasa, pior que marca, lâmina afiada, arma ou até mesmo que um exército inteiro. É pura dor, é aflição no peito, é tipo marca, que não desmarca, dor que não passa, aflição que não alivia. É duro, mas é coisa que não se esquece.
    Já pensou ser marcado na pele, daquela marca com o nome da criatura e levar isso para o resto da sua vida? Pode até parecer que vezes ou outra aquela marca estaria a ponto de desbotar, mas é mentira, não desbota, não vai embora. E você lembra todo dia, como se fosse ontem. E ri e chora. E não passa.
    Calma menino. Amor é bom. Do tipo bom, daquele tipo que se você for esperto você vê e sai correndo. Mas, se for a grande maioria você fica tipo mosca morta estaqueado e capturado, indefeso. 
    Pensa só na pessoa que você mais ama. Esta pensando em esquece-la? Já fez milhares de promessas de nunca procura-la, não é mesmo? Já apagou o telefone dela da sua agenda um trilhão de vezes? Já disse que a odiava? E depois disse que não sentia mais nada? E depois disse que era só amizade? Quem sabe então você também deve ter se dito que nunca mais iria voltar atrás, que a vida sem ela é muito mais fácil, sim? Interessante. É, pois é. Se sim, se é fato que sim, sinto muito, você acaba de ser a mosca. Alvo difícil esse, bem vindo ao clube, não, não há instruções no rótulo dessa porcaria toda e não, não tem como esquecer. Engole o choro, quem se apaixonou foi você. Ninguém disse que amor era fácil, e sim bonito portanto é abuso querer que seja simples, não é mesmo?

Annabel Laurino.

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"Não sei por que todos me adoram se ninguém entende minhas idéias."


Albert Einstein


Revérbereo

    Sensação reverberada essa. Meio que uma coisa tênue. Fruto pendido do galho da arvore, por uma liga fina quase fracamente e somente que se sustenta. Estava quieta aqui, pendendo dentre as bilhares de duvidas que assomam dentro da minha mente, e convicta de que uma razão simples poderia de fato existir. Tornar assim as coisas mais fáceis, ou simples, ou simplesmente simples, mas não simplificadas, por que ao todo perderiam a graça.
  O que eu quero mesmo dizer, é que eu estava aqui, parada, ouvindo a reverberação tênue do ar, do vento solto no cabelo, brincando de cambalhota entrementes com os meus fios dourados até que de repente uma coisa pesada, um fruto da arvore caiu sobre minha crista e eis que bati a porta da vida, tão alegre e mansa como um  filhote de leão perdido, porém sedento de sua inevitável e real natureza. Então, abri a porta e entrei no mastro espetáculo de acontecimentos, e abri um livro e mais milhares de livros, e eis que me perdi como não esperava me perder, porém descobri coisas, e possuo segredos, e tenho medos constantes. Suspeito quase sempre que se começasse a falar, ou escrever, sobre todos eles, ninguém acreditaria e me diriam como louca, e eu não ligaria, não importa afinal, são apenas fatos.
     Nada que passe de uma reverberação nervosa titubeando no mastro do navio em alto mar, ou como queira pensar, do peitoril da janela em uma triste e azeda manhã de março. Tanto faz. Há coisas que são para serem vistas, sentidas, e assim acreditadas, porém, poucas são vistas que se dirá sentidas ou de fato creditadas de um pouco de fé.
     Eis que sou uma delas.


Annabel Laurino.

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Pode ser que um dia deixemos de nos falar...
Mas, enquanto houver amizade,
Faremos as pazes de novo.



Albert Einstein