terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Bolso das dores.

- Amigo, tome.
- O que é exatamente isso?
- Minha dor.
- Ah claro, como pude esquecer? Dê-me logo aqui. Isso, muito bem, guardarei-a aqui dentre do bolso de minhas vestes e não precisarás mais lembrar que sentes dor alguma.
- Promete mesmo? Por que me sinto tão só, é tanta dor que quase nem cabe em mim. São tantas histórias e tantas e tantas coisas que se passam aqui dentro que eu..
- Calma menina, calma. Estou aqui. Já guardei sua dor. Agora vamos, sente-se pois me contarás sobre teus sonhos ou teus pesadelos e todas as coisas mais que te pertubam. E acredite, passará.
- Mesmo?
- Mesmo menina, mesmo.

  bebellaurino.



Entenda

    Desta vez, dentre todas as outras, é completamente diferente.
    Entenda, esta sendo muito difícil para mim agora. E esta sendo duro fechar as portas da casa e trancafiar as janelas jogando a chave fora e arrastando comigo o vazio ininterrupto que é o de aceitar o fim.
    Por isso, por isso você não vai ouvir um se quer gesto meu, nem mesmo qualquer ruído que seja. Por que seria impossível. Sinto-me como os gerânios de Caio Fernando Abreu. Adormecidos, parados, observam e não sentem mais coisa alguma.
    Espero que entendas. Já que não acerto mais seu coração, já que minhas palavras doces pra ti tão amargas e tão cruéis não surtem efeito ou indiferença, digo, entenda. Seria cruel de mais ter de desenterrar as chaves no quintal e com as mãos tremulas e com o peito palpitante e com as vestes sujas de terra abrir a casa outra vez. Me esbaldaria na vontade insana de me jogar outra vez nos teus braços, de tomar um banho, de lavar as vestes, e de te contar minhas histórias e de chorar a minha dor. Não conseguiria mais sair. Faria um café forte para nós dois e sentaria na varanda admirando o sol, ou a chuva. E se outra vez uma ruptura cruel ameaçasse a aparecer eu teria que novamente abandonar a casa, apagar o fogo na lareira, fechar as janelas, jogar fora as fotos, esquecer os cheiros, lembranças e partir. De novo. E de novo.
    Não parece cruel de mais para você?
    Entenda.


Annabel Laurino.

.

"Mas se eu tivesse ficado, teria sido diferente? Melhor interromper o processo em meio: quando se conhece o fim, quando se sabe que doerá muito mais -por que ir em frente? Não há sentido: melhor escapar deixando uma lembrança qualquer, lenço esquecido numa gaveta, camisa jogada na cadeira, uma fotografia –qualquer coisa que depois de muito tempo a gente possa olhar e sorrir, mesmo sem saber por quê. Melhor do que não sobrar nada, e que esse nada seja áspero como um tempo perdido."

                                                        Caio Fernando Abreu