quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A Coisa

    Era uma coisa corrosiva, começou assim, pequenina, era um veneninho bobo cor de rosa que titubeava no meu peito, inofensivo, não tinha cheiro e quase não tinha cor. Era fofo como uma pluminha. Tinha por sua incumbência um modo de se ver quase que arrancando a vontade de morder. Era uma admiração branda, um sentimento terno e especial.
    Daí você se aproximou, foi passando os braços envolta de meu corpo, foi fazendo carinho, foi despertando essa coisa corrosiva e antes inofensiva, você a acariciou, tocou em seus pontos frágeis, descobriu seus segredos. E logo essa pequena criatura se alimentou de seus carinhos, de seus afagos, de sua atenção. Ela, tão burra que era, se alimentava até mesmo do vazio de sua presença, começou a comer as paredes de sua falta de fé e logo estava engatinhando. Ficou gorda, vermelha, gigante. Quase não cabia mais em mim. Ela gritava toda noite, exigia alimento, alimento que eu não podia dar. O que podia fazer? Ela queria você. Mas você havia partido então, tinha dito: “seremos amigos, quase irmãos.”. Mas a coisa, a coisa enorme e gigantesca dentro de mim, não queria isso, ela berrava, chorava, como um alarme de incêndios ela soava. O que eu podia fazer? Matar a coisa? Sem dó? Sem piedade?
     Oras, fora você quem a criara, na verdade foi você que a cultivou. Eu dei vida a ela, mas não fui a única que lhe concedeu o direito de te amar. Agora querido, agora ela morre sozinha. Todos os dias ela morre de fome, de dor. Você não deixou mais nada. E tudo que sinto enquanto aquela coisa chamada amor, morre e morre, de dor. A dor e a tristeza de pensar que eu deixei você fazer tudo isso comigo. Eu deixei que você me alimentasse.



Annabel Laurino.