quinta-feira, 2 de maio de 2013

Winter Lady

   Sei que você sabe que eu começarei falando que está chovendo lá fora e eu estou aqui novamente em mais um dia chegando ao fim junto com a rapidez que esfria o meu café preto do meu lado. Sei que você sabe exatamente o que eu penso enquanto olho para um lugar qualquer através das janelas e fico suspirando devagarzinho enquanto ouço aquela musica que fala de um ultimo beijo. 
   Eu não posso evitar. É toda essa energia que fica no ar, essa atmosfera compressora, nostálgica e etc, você sabe, aquela minha inclinação para ser poética, eu simplesmente não consigo evitar. São essas tardes que escurecem rápido, as filas nas praças para pegar o ônibus, o cheiro do café com o frio assomando lá fora e a chuva caindo fraca, as pessoas e suas roupas novas para a estação que chega. Tudo isso toca, sabe, toca que nem uma musica lenta.
   Mas eu estou tentando não ser mais nostálgica, e eu sei, é quase impossível dando-se minha natureza por si já conhecida, mas eu tenho tentado. Nos últimos dias provei de um sabor antigo e que eu nem lembrava mais, o da solidão. Pela primeira vez depois de muito tempo eu fiquei completamente só comigo mesma e você não vai acreditar, mas eu me senti feliz depois que o susto foi embora. Porque claro que teve um susto, foi como se eu fosse jogada numa piscina de água fria, de repente todas aquelas relações sendo cortadas sem quase nenhuma explicação que me confortasse. E nada e nada. Foi um susto daqueles. Dormi mal durante algumas noites e em outras eu fiquei completamente acordada tentando entender o que tinha acontecido.  
    Não que eu entenda completamente agora. Na verdade eu arrisco dizer que o entendimento de tudo isso nunca virá ao meu alcance, e acho até melhor assim, já doeu uma vez e não quero que doa novamente, então prefiro que fique um silêncio absoluto sobre isso e que o caso de-se como decretado. Você sabe, certas coisas é melhor não se saber. 
    Então depois que o drama mexicano passou, eu me acostumei, veja só. Criei em mim aquela antiga doçura de estar só consigo mesmo e gostar dessa sensação. Comecei a curtir cada segundo novo e que antes eram desperdiçados em vão, comecei a amar essa sensação renovada que não veio com sol forte e nem tempo de verão. Você sabe, eu sempre fui do contra então a minha fase renovada tem folhas secas e tempo frio com direito a chuva e cachecóis bonitos e cabelos esvoaçantes num vento gelado de final de tarde. Meu tempo renovado tem gosto de café com direito a novas descobertas que só o tempo irá dizer.
    Entendi que não valia a pena todo aquele drama, entendi que tudo passa porque tem que passar e é assim que sempre vai ser. É como eu disse, algumas coisas não servem para serem entendidas, servem apenas para você se conformar, porque é assim que é. E eu me conformei, com a falta de tudo que poderia simplesmente ter faltado, me conformei com tudo que aconteceu e deixou de ser e então morreu. Mas isso não quer dizer que foi o fim, não, para mim pelo menos não. Foi apenas o meu impulso vital do que eu chamaria de regresso de mim mesma. 
    Como se eu acabasse de fazer uma viagem longa e cansativa, meus pés ainda doem mas é realmente ótimo ter voltado para casa finalmente. Para a minha casa, que é aqui onde eu realmente estou agora, dentro de mim mesma, porque ainda não tenho um outro lar para o qual eu possa me esconder, eu ainda não encontrei a minha outra casa além de mim mesma. Mas não importa. Não importa que eu esteja absolutamente só e que meu coração simplesmente se negue a confiar novamente até mesmo na sombra de uma árvore ou num projeto de luz que se encaminhe adiante, não importa porque eu finalmente reaprendi a respirar sem tubo de oxigênio auxiliar, mesmo que seja doloroso as vezes, é necessário sobretudo.
    Regressar é sempre bom e sentir as cobertas macias da minha cama me confortam toda noite, porque mesmo com as marcas que eu fiquei depois que tudo aconteceu, eu sei que toda manhã quando o sol fustigar na minha cara desmantelada de sono será um dia a mais, um dia a mais que eu estarei esquecendo, um dia a mais que eu estarei ficando melhor, um dia a mais que tudo isso estará ficando para trás e as feridas cicatrizando. Até que um dia eu esteja realmente pronta para respirar fundo, quem sabe num inverno adiante, quem sabe nesse mesmo, com chuva ainda, e olharei para fora da janela, você saberá o que eu estarei pensando, você sempre saberá. Soltarei um suspiro, dessa vez de satisfação e pensarei com meus botões que 'sim, eu estou pronta para outra até mais adiante ou agora. Eu estou pronta.". E esse dia, você sabe, vai chegar. 





Annabel Laurino


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“Sou um ser do tipo sanguíneo que oscila muito. Tenho momentos de extrema alegria e momentos de profunda depressão. Não obedeço a uma agenda: hoje vou sentir isso, amanhã vou sentir aquilo. Reajo aos acontecimentos à medida em que o ambiente reage sobre mim. Mas como sou hipersensível, as coisas têm às vezes um valor que a maioria das pessoas acham ridículo. Mas eu sou assim mesmo. Por exemplo, às vezes fico furiosa com uma pessoa cujo problema talvez, você contornasse com um simples puxão e orelha. Ao mesmo tempo, tomei agora consciência de que essa não é uma atitude lógica e estou procurando me reestruturar.”



- Elis Regina em entrevista a Clarice Lispector