Tanta coisa meu amor que deixou de ser e agora já não é mais. Fica só aí, nas linhas retas e monótonas do seu diário escondido. Coisas bobas, memórias, acontecimentos passados. Porque tudo é passado, até mesmo esses papéis com letra rabiscada as pressas, na euforia de escrever novas e mais novas coisas, de preencher as folhas avidamente, com sucesso, com amor, carinho, como uma criança feliz. Hoje, me aconteceu algo... E assim por diante.
A onda do tempo vem e nos arrasta para longe, tão longe ficamos da praia. A arrebentação nos empurra, nos coloca contra os ponteiros do relógio numa luta sem fim. Como nadar contra a corrente, como diria um velho pensador.
Lá estão suas páginas, preenchidas, seus dias de inverno, suas tardes de café quente, seus amores enfeitados com uma tinta de caneta colorida, dado codinomes para que ninguém além de você pudesse saber. É como um segredo bom que só você carrega no peito, ninguém precisa entender, ninguém irá entender. Essas coisas de gente grande a gente só finge que não acontece, a gente enfeita a vida para que fique mais bonita, mais aceita, mais florida.
Como jogar purpurina para o alto e ver as partículas coloridas e brilhantes fosforescerem no alto da sua cabeça, assopra, assopra. Elas caem sobre seus cabelos, a luz bate nos seus cílios agora cobertos de pó brilhante e você acredita quase que por um fio que a vida é como uma purpurina lilás.
O hoje, amanhã já será passado. Já terá passado.
No seu diário secreto que guarda embaixo da cama terão outras páginas a serem preenchidas, que você irá escrever num lusco fusco de uma tarde de verão perfumada. Tomando chá gelado na varanda, sentada sobre uma rede, o cabelo preso num coque bagunçado, você pensará mil vezes que a vida é mágica. Você aprendeu a esquecer os cortes lentos que já levou. Tirará o gosto doce.
E o gosto doce esse sempre virá. Mesmo que as vezes não se perceba. Te surpreenderás que mesmo depois do choro você aprenderá de novo e de novo e novamente e vai conseguir tirar seu próprio coelho branco da cartola. Ou o que quiser tirar lá de dentro. Você pode escolher, a vida é sua.
Ah menina, se tudo fosse fácil, essas palavras não existiriam. Se tudo fosse belo e não assim tão frágil, as palavras não existiriam. O seu diário secreto perfurado de codinomes nas entrelinhas também não existiria. É preciso sempre disfarçar um pouco para que não doa.
E assim nós vamos indo, nadando contra a corrente só para exercitar. Um dia a gente aprende, ou não, quem sabe.
Buscando o gosto bom que tudo isso pode ter, esquecendo, lembrando, anotando, dançando numa musica louca, cantando até encontrar a rouquidão da garganta seca.
We are infinite.
E essa é só mais uma página.
Annabel laurino