Mergulho
na imensidão dos teus olhos, mergulho sem pressa, como se me encobrindo lento e
vagarosamente do brilho incessante que emana deles, que me aquece. Tuas mãos
tem cheiro de manteiga, e eu digo isso, “tuas mãos tem cheiro de manteiga”,
você ri e pede desculpas, mas eu digo pra você não se desculpar, porque eu
gosto disso. Beijo os dedos compridos da tua mão ossuda e tão branca, a
mordisco e pra te trazer ainda mais perto, eu a repouso no meu pescoço,
como se fosses meu. E é, você é meu.
Você
me delineia com os dedos, faz o contorno do meu rosto com a ponta rija e quente
do teu indicador, mergulhando teu polegar nos meus lábios, perpassando tua mão
pelos meus cílios azuis. Estou nadando na profusão de nuances dos
teus olhos, estou te adentrando lentamente. Você diz que eu já te invadi há
muito tempo, que já faço parte. Isso me faz sorrir jocoso, gostoso,
sorrir com o corpo todo entregue a você, que me esperastes por tanto tempo e
mesmo assim, me recebestes tão tua, tão bem.
Por
isso eu me aproximo com imenso cuidado, abro a porta com delicadeza. Com mais
sutileza ainda, mais do que eu posso ser capaz, solto as minhas bagagens ao pé
da porta, e entro no teu espaço, no seu eu, tão límpido e cheio de luz, tão
bonito. Tenho com a tua alma o cuidado que se tem com o peso de uma luz.
Não
canso de te olhar, tudo o que vejo repousa nas pálpebras da minha alma e é
nessa dança em que permanecemos. Chove lá fora, alguns barulhos da cidade
adentram a sala através das finas camadas de concreto e reboco de parede. Não
importa, estamos perdidos em nos olhar, em misturar nossas risadas num mesmo
compasso, em confundir nossos cheiros e mesclar nossas cores. Te gosto tanto e
tão profundamente, intensamente. Te fotografo em detalhes; teu nariz perfeito,
tua boca tão grande, as sardas do teu rosto, a pinta embaixo do queixo, teus
caracóis em formato de cabelo, farejo teu cheiro, aroma fresco de banho
misturado com o cheiro gostoso que a tua pele tem. Eu registro tudo e amo cada
detalhe.
O
gosto de café que incide na tua boca é o mesmo que se profana na minha com o
teu beijo. Te olho mais uma vez e te invado com o meu olhar. Você, meu amigo,
minha casa, eu quero você. Se fosse possível emitir telepaticamente todos os
sinais de tudo o que eu preciso te dizer, então você já teria compreendido mais
além. Mas não o é, e por isso eu continuo a te olhar, e te olhar e a me perder
na vastidão pura e rarefeita do teu olhar. A desejar morar em você por tanto
tempo, por muito tempo, por mais do que o tempo possa contar.
Suspiro alegre,
perdida em meio aos teus braços tão compridos. Até que enfim eu encontrei o meu
lar.
Annabel Laurino