quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Incidência seca


São nessas rachaduras que se encrespam ásperas pela tua fala vazia que te desgrudas de mim como uma folha seca pendida no ar até que escorregue e caia e deslize na triste grama verde, arranhando seus vasos secos e queimados junto aos vasos úmidos e molhados das folinhas verdejantes e luminosas que crescem da terra árida e também fértil e também úmida e tão negra, despejando-se, recaída no silêncio, esquecida, acaba morta, esmagada pela memória, cruelmente assassinada pelo vazio.

Annabel Laurino.

Perguntando-me, respondo-me, sempre e sempre. Fatal.


Me pergunto se a gente se encontra um dia.
Me pergunto se você me ouve.
E nunca sei se sim ou se não.
Me perguntou outra vez
Sem cansar, sem calar
Se me amas mesmo, se realmente me amas,
Se farias qualquer coisa por mim
Se trocarias letras por números
E mudaria os nomes de cores e sabores
E deixarias teu mundo inteiro por mim
Penso sempre,
Quase sempre
Pendida entre o sim e o não
Que não
Que não te encontro mais
Que não me ouves
E pendida outra vez, quase que categoricamente
Escorrego na reentrância múltipla de incertezas
E acabo
Fatalmente
Em não.

Annabel Laurino.

Sem querer. Desejo.


    Não queria estar aqui, sentada no meio do quarto ouvindo o silêncio obscuro da falta de palavras que me fogem da boca, que escorregam e somem, quando eu mais preciso.
    Pensando bem, muitas coisas, ou pessoas, somem quando se mais precisa.
    Estou pensando nas coisas que eu mais desejaria no momento e me veio, meio que sem querer, meio que abruptamente, uma lâmpada acessa e o rosto dele cintilou brilhante no canto esquecido da memória.
    Difícil dizer. Qualquer coisa que seja. Passou-se tanto tempo, tanto e tanto, que pensar nele é como pegar um objeto no porão adornado de pó e teias de aranha, rachaduras do tempo e todas aquelas coisas mais que se acumulam pela falta de lembrança. Lembrança do toque, do ver, do sentir...
    Fiquei sentada um longo tempo aqui e nada me vinha e de repente me veio ele, assim, de repente. E lembrei do seu colo amigo, das suas maneiras doces e educadas, do seu afeto, da sua forma carinhosa e se
mpre tão... Madura.
    Sorri. Sem poder impedir também. Sorri pois tudo que me veio foi doce. E o paladar tornou-se doce, doce, e tudo que comecei a sentir foi doce também. E depois um pouco amargo. Não, não foi saudade, não foi arrependimento nem coisas assim, nem mesmo aquela velha história do “ah, SE eu tivesse feito diferente”.
    Foi algo mais como admiração misturada com um certo sentimento de queria-te-ter-aqui-agora, mas sem ser saudade. Mais como necessidade latente. Tudo bem, saudade então. Foram bons momentos, foram boas histórias. Cresci e estou aqui, pensei, sozinha, sempre, quase sempre, praticamente sempre, sozinha.
    Mas foi fato de que ele me veio, e que permaneceu por um pequeno tempo, daí pensei e pedi pra Deus que cuide dele, que tenha ele em mãos, e desejei paz, amor, tudo de bom. 

Annabel Laurino.