quarta-feira, 27 de julho de 2011

Tempo. No tempo. Do momento. No sentir...

    Tudo ultimamente tem parecido meio louco. Não sei se o relógio me engana, mas as horas voam, passam rapidamente, dispersas ao meu olhar. Queria que o tempo parasse um pouco e me desse um segundo a mais, só para poder digerir a idéia da nova correria, das novidades dos dias, dos sentimentos.
    Eu não sei como dizer, mas sustento dentro de mim, mesmo que por fora não aparente, uma estranha vontade de ser cuidada. E isso pode nada ter haver com a minha estranha necessidade de que o tempo parasse.
    Às vezes, depois das loucuras do dia, no descanso da noite, trancada no quarto, a porta fechada, as luzes apagadas, me pego escutando musicas que prometem um abraço, um carinho, um amor. E no meio do escuro, meus olhos fechados agradecem por ninguém ver o que peço silenciosamente... Não peço uma, nem duas vezes de um dia normal, com alguém normal que possa apenas servir para satisfazer um vazio carnal eletrizante e gritante dentro de mim, ou que possa apenas matar essa sede escapista de ter com que repartir um pedaço da vida, da dor, do amor. Apenas, peço humildemente, ao tempo, no silêncio, um segundo para tudo parar e que nesse pequeno intervalo de tempo, eu posso sentir a aproximação eterna e tão desejada de alguém especial chegar. Quero que o tempo pare para me deixar sentir. Sentir alguém, esse alguém especial, me tomar em seus braços e dizer que sempre me quis, mesmo quando o tempo, no escuro do tempo, na velocidade do vento, não podia me ver.
    Não sonho em sonhos perfeitos, em perfeições físicas, ou mentais. Nada é pronto, nada é perfeito, nada é completamente lindo ou surreal. Não peço nada assim, nem sonho assim.
    É apenas um clamor cálido, daqueles que se faz quando se está só, quando se pode pensar melhor, quando se pode ouvir atentamente as batidas da musica que agora já não mais soam de seus fones de ouvido, mas de lá dentro, do seu coração. Você pode ouvi-las atentamente agora, na percepção do escuro, na falta de luz, sua mente trabalha compassadamente junto a pureza de seu coração. E você sente-se fechando os olhos, é uma batida bonita, sincronizada, não há bem um som, mas é o seu som, é bonito, é real. Você pede, a ultima coisa que pode pedir, para que um dia não seja a única a ouvir esse som. Esse belo e verdadeiro som da vida. Esse real e surreal clamor de... Sentir.


Annabel Laurino.



Ainda sou... Ainda serei... Uma eterna garotinha...

    Quando ficamos velhos, ou melhor, cada vez mais que ficamos velhos, temos a exagerada tendência a ser incrivelmente chatos sem perceber.
    Coisas que antes nos faziam rir e apertar a barriga em meio a gargalhadas e choros de risos, com o tempo passa a ser substituído por um união de sobrancelhas enrugadas, olhos apertados, resmungos exagerados...
    O abraço da mãe na frente dos amigos nos deixa irritadiços e sem jeito, o aperto nas bochechas da sua tia avó torna-se insuportável, as gargalhadas de seu primo mais novo no cinema por que achou a cena engraçada é no mínimo irritante, a guerra de bolhas de sabão é insignificante, as garotinhas convidando-a a brincar de cartas é irrelevante, seu tio coruja tentando paparicá-la como se ainda tive cinco anos de idade é idiota, suas amigas fazendo guerras de travesseiro é besta, e sua mãe querendo contar suas histórias de criança é... chato.
    Por quê? Por que temos essa tendência de sermos incrivelmente chatos conforme vamos crescendo? Por que não podemos rir sempre? Por que não podemos estarmos felizes sempre? E, pior ainda, por que as coisas de crianças que um dia fora nosso presente agora tende a ser uma coisa tão incrivelmente esquecida?  Como se nunca tivesse existido.
    Não entendo isso. Ainda sou uma eterna criança exagerada. Tudo bem que às vezes por baixo de meus óculos de grau e de meus livros chatos eu pareça uma nerd ambulante extrapolada de estranha e sem um pingo de risos. Mas me faça rir. Eu adoro.
    Vamos motivar mais isso. Rir mais. Brincar mais. O que tem de errado nisso? A vida não foi feita para ser levada tão a sério assim. É importante conversar, trocar idéias, entender o que se passa no dia-a-dia, falar sobre questões mundiais exageradamente importantes.
    Mas é mais importante ainda viver. Rir, pular, sorrir, gargalhar. Saber rir das coisas pequenas, saber manejar as situações infantis e relembrar os velhos tempos.
    Sentada na grama seca, brincando de bonecas a tarde inteira, comendo sorvete direto do pote, fazendo biscoitos e sujando a cozinha de farinha, pregando peças nos avós, inventando histórias, inventando brincadeiras.
    Ainda guardarei meus velhos tempos, ainda lembrarei de quando ria sem motivo, de quando me esquecia do mundo, e de quando inventava um só para mim. Ainda caminharei de pés descalços sobre a grama fria, ainda sujarei a roupa, farei bagunça, ainda andarei descabelada se bem me convir, ainda comerei sorvete do pote, andarei de balanço, correrei no parque, ainda tirarei fotos doidas que ninguém precisa ver, ainda rirei tanto que chorarei, e cantarei tão alto que meus pulmões protestarão.
    Não é necessário agir como criança. Mas aquela que existiu um dia, não precisa ser apagada completamente de mim.



Annabel Laurino.



Gosto de como... Meu corpo...

    Gosto de como a sutileza de um bocado doce de ternura beirando a inocência às vezes se apoderam de mim. Gosto do tom da minha voz, da minha risada em escalas, meio ponderada, meio casual, meio arrastada, meio sensual. Às vezes como um ponto, gritante ela afina, e depois se espicha meio como uma calda espiralando no ar. Gosto do gosto adjacente da sabedoria afiada que arde na ponta da minha língua quente, das palavras em meus olhos, iluminando a alma, aquecendo a mente. Gosto das feições costumeiras de meu rosto brando. Gosto da minha pele, febril e macia. Do brilho do sol invernal repousando calidamente sobre meu corpo. Gosto de como esse mesmo sol fica dourando os pelos de meus braços nus, iluminando e recaindo sobre minhas pestanas negras. Gosto de como meu corpo se acentua sob um vestido negro, e que eu, ao todo muito branca, pareço assim, meio faminta, meio felina, meio brutal.
    E por fim, gosto do meu corpo. Gosto do que ele faz. De como ele faz.


Annabel Laurino.



Dias Anormais

    Hoje é um daqueles dias anormais. Prefiro chamá-lo assim, por que anormal é a única palavra que consigo descrever dias como estes.
    Meio cinzentos. Começam de uma forma doida. Você desperta de um sonho maluco que mesmo depois de acordada você fica relembrando-o, deixando que as lembranças do sonho perfurem na sua mente com um sentimento de agonia. O que ele quis dizer?
    Depois os invariáveis e sucessivos acontecimentos que correm diante da mudança das conotações de cores do dia são repetitivos, e anormais. Acontecem como qualquer outro dia, você faz praticamente as mesmas coisas. Porém seu corpo está pesado, sua mente é um turbilhão, suas mãos tremem e sua boca é um poço de ressequidão. Dias em que nada é explicado. Dias em que parece um ponto no meio de mais tantas vírgulas, você não sabe o que se sucede depois, você não sabe nada. As coisas que vem acontecendo ultimamente são inesperadas, os sentimentos cálidos que lhe preenchem são surpresos, como bolinhas explosivas explodindo dentro de você.
    Estou tentando manter a calma em dias anormais, estou tentando ser indiferente, agir como se nada estivesse acontecendo. Mas é complicado. Me encontro em um emaranhado de fragmentos circunspectos que são essenciais no dia, na vida e não posso fugir. Não posso fugir desses sentimentos que me golpeiam, que me perfuram até mesmo nos dias normais, que se tornam anormais.
    Vou ter que aprender. Vou ter que entender isso. Em cima da dor, e da reentrância de um sentimento remotamente só e vazio, vou ter que me virar. Vou ter que começar a encarar.
    Até mesmo nesses dias... Dias anormais.


   Annabel Laurino


terça-feira, 26 de julho de 2011

Somos os Neandertais da Nova Geração...

    Lembra daquela musica do amado Cazuza em que ele dizia tão bravamente: “seres humanos vivendo como bichos”? Nossa, Cazuza estava completamente certo no que dizia. Quinze anos se passaram desde que o trecho da música explodia nas rádios. Mas a realidade da musica é cada vez mais perturbadora.    
    Hoje nós seres humanos matamos e roubamos por tão pouco. Agredimos e falamos tão violentamente por meras futilidades que já não se sabe mais o que se está em jogo, sua vida comparada a futilidade do motivo versos a razão. É uma loucura abominável que adentra nossos dias, não é preciso ficar tão surpreso assim, é só ligar no jornal e assistir todos os dias, você sempre pensa que não viu nada igual até que... Olha só, tem mais gente louca por ai!
    Gente louca? Gente louca é pouco. Gente que não deveria ser chamada de gente. É real. Pessoas que agridem crianças por que os pais as ofenderam, maltratam e seqüestram, prendem e depois as matam. Que horror, que atrocidade! Até mesmo as crianças que são o futuro de uma nação hoje não passam ilesas sobre uma confusão. Animais sendo brutalmente mortos, colocados em fogo, queimados, agredidos... Pessoas bêbadas, drogadas. Jovens na prostituição.
    A alucinação dos dias, do dinheiro, da renovação tecnológica e a inovação de uma nova geração de modas e maneiras transformou as pessoas no que se pode chamar de bichos. Meros neandertais vivendo em suas cavernas com luzes, piscinas e roupas de grife. Andando em seus carros esportes de ultima geração com pneus de pedras, tapando os olhos com vendas de gripes de mil reais pra protegê-los do sol. Ou da realidade?
    Não importa o que façamos, o quanto o mundo ande e se altere, seremos sempre eternos brutais, loucos e fascinados pela loucura, seremos eternos ignorantes. Mataremos por pouco. Perdemos o valor da vida. Somos como os homens das cavernas, não importando quanto você tenha no banco, qual é o seu titulo de família ou quantos anos você passou na faculdade estudando, isso não é nada, simplesmente nada, se amanhã ou depois você consegue matar a sangue frio.
    Onde estamos? Onde foi que nos perdemos?
    Que saber?
    Talvez seja mesmo razão. Talvez tenhamos mesmo nos afastado de Deus.

Annabel Laurino.

Você me deixou assim. Estou assim agora, e....

    Quero me desprender de você. Mas como faço isso? Já estou presa! Estou amarrada na sua história, em seus sentimentos transbordantes e até mesmo nas suas coisas fúteis. Você adentrou em mim, perfurou um buraco no meu peito e entrou, sem licença, sem hora, sem pedir. Você não se enxerga como eu o enxergo. Como nos enxergo. Somos completamente iguais. Iguaizinhos um do outro. Você é meu par, eu sou o seu. Somos assim...  Estou assim agora, agarrada a histórias fantasiosas de filmes antigos e românticos, estou presa á uma coisa que nem se quer pode existir. Estou sendo pessimista, romântica e profundamente repetitiva. Sempre gosto de quem não vai gostar de mim. Mas agora é diferente. Você não vai gostar de mim. Mas eu vou. De outro jeito.

Annabel Laurino.

sábado, 23 de julho de 2011

Caixa

 É nessa caixa secreta perdida no tempo, levada pelo vento que me escondo de mim. Já não sei mais como cheguei aqui. O que fiz o que perdi. Ainda estou  pensando por que, e como me deixei assim. Pisei sobre meus ideais, esqueci minha filosofia de vida, minha ideologia constante. Sinto minha pele arroxeada de frio arder em brasas da vergonha, da luta e do medo que senti. Sinto medo de mim. Vergonha de mim.
    Que triste.
    Choro por que não sei para quem me desculpar. Fui eu que me infligi, fui eu que me machuquei dessa vez. Abri a porta sem ter permissão por fazê-la. Me igualei a quem não queria me igualar. Me perdi.
    Chorei.
    Choro por que sinto medo, sinto danos irrecuperáveis no tempo, nos dias que se passaram, que se alastraram a minha frente e que eu me esqueci. Esqueci de você e de mim. Sou egoísta agora, mimada e triste, sou dor e amor. Só não sei com quem dividir. Guardo tudo pra mim dentro dessa caixa fechada onde ninguém pode saber estar. Guardo trancada, selada, escondida. Só abro pra quem souber o segredo de como me abrir, de como fazer eu me entregar. Enquanto isso, fico como uma vara coberta de cera endurecendo ao vento quente que congela meu corpo varal, visceral, viscoso. E tudo isso me cansa. Me fatiga. Já não agüento mais pensar em mim.

     Annabel Laurino



Estou doente.

    Estou doente. Oh sim, estou doente. Essa letargia constante em que me encontro abomina meu corpo, adentra minha alma, crucia meus pensamentos, paralisa minha fala. Estou doente. Essa capacidade imunda da realidade que abre e fecha os poros na minha pele branca deixa marcas. Dor. Estou doente. Quero salvar meu corpo, viajar com minha alma para muito longe, cavalgar sobre meus instintos prolíferos e não saber onde estou. Não quero sentir. Ou quero sentir. Já não sei mais qual é o pior. Se sentir, morro de dor, se não sinto, morro de nada. Morrer de nada. O que é pior?
 Estou fraca, estou só. Estou doente. De amor, de dor, de ódio. Fustigam minha alma, arrancam meus pelos, puxam meus cabelos. Sem dó. Esse caso danoso, essa fúria desse mar de confusão custa tanto a passar. Vou fugir, vou chorar. Estou doente. Mas ainda estou aqui. Ainda sinto meu corpo que não se mostra mais tão lúcido e nem mais tão frágil. Ainda sinto-o em mim. Ainda estou aqui. Ainda grito e falo. Ainda sinto prazer, ainda sinto-me excitada na loucura dos meus atos, na loucura da vida, do dia, da dor. Sou insensata na dor. Até mesmo na dor.
 
   Annabel Laurino.


quinta-feira, 21 de julho de 2011

Ser para alguém

    É difícil dizer. Eu queria ser aquela garota que fosse convidada para alguma coisa. Nem que fosse para sair e ver a monotonia da vida, da cidade, das árvores, do tempo. Eu queria isso. Queria ser a garota que tivesse um beijo roubado, a mão pega por cima da mesa, o olhar encontrado, uma flor recebida, uma carta guardada. Eu queria ser a garota que roubasse o coração de alguém, que roubasse o tempo de alguém. Queria ser o pensamento incessante e provocante. Queria ser a garota cujo motivo tiraria o sono, roubaria horas de pensamentos confusos, o motivo de pensamentos imaginativos, doidos. Queria ser aquela garota que arrancaria sorrisos, faria as horas passarem sem serem percebidas ou contadas. Eu queria ser o motivo de alguém olhar o celular a cada minuto pra ver se uma mensagem minha chegou, pra ver se liguei, se me importei. Queria ser para alguém o motivo de acordar sorrindo, de pular da cama e pensar em mim, queria ser a luz do dia, o aconchegar da noite, a solução da mesmice, o grito no silêncio, o abraço esperado, a saudade correspondida, o aperto no peito, a vontade mais louca, o lado mais puro, a alegria constante. Queria ser aquela pessoa que esse alguém largaria tudo, deixasse tudo pro ar, que esquesse o mundo por mim, pra fugir, pra me encontrar.
    Eu queria ser. Não sou.

    Annabel Laurino

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A verdade é que uma incógnita vermelha ainda esconde-se dentro de mim.

 Annabel Laurino.

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Forma física nada. Forma humana de ser.



Annabel Laurino.



sábado, 16 de julho de 2011

Viva


Eu gosto do silêncio... Eu o venero. A quietude quente e amistosa. Mas hoje... Hoje eu quero abduzir o silêncio, quero amassá-lo como a uma folha de papel, quebrá-lo em pedaços indefiníveis e jogá-lo como uma bola arremessada no ar para muito longe. Quero rasgar as cortinas genuinamente brancas, pintar as paredes de qualquer cor que seja cor, quero abrir as garrafas de café e ligar o som, quero derrubar os móveis por acidente e deixá-los por lá por quanto tempo for preciso, jogados, esquecidos, corpos sem vida mortos no chão. Eu os matei. Que tragédia, que maldade. Quero, como quero dançar, mexer o corpo e passar as mãos pelas coxas em carne, minha carne, sentir a quentura do suor grudando, ligando as partículas da pele, quero pegar a pele e apertá-la, apertar a mim, e sentir, continuar, subindo e descendo. Meu corpo. Eu estou viva. Sim. Barulho e barulho. Estou viva. Movendo-me como uma alga marinha no mar sendo levada e levada, dançando, a água fluindo, posso até escutar o som. Morder, comer, jogar, pular, é só no que consigo pensar. Verbos. Sair, correr, olhar, respirar, sorrir, gargalhar. Apertar. Instigar. Mover.


  Annabel Laurino. 

sexta-feira, 15 de julho de 2011

A espera.


 A porta azul ainda estará aberta. A maçaneta cor de rosa ainda clicará fácil quando você for forçá-la. Ela clicará e você poderá abri-la e entrar. O tapete verde mar ainda estará levando-o para o mesmo lugar, flores amarelas e azuis estarão nos vasos brancos, onde você deixou antes de sair. Os quadros de molduras em neon estarão gritando no corredor, o piano estará tocando sozinho, nenhuma figura estará dedilhando o teclado empoeirado que você deixou para trás. Quando partiu. Minha boca seca estará gritando, a pele nervosa e rachada estará suplicando. Não, água não. A fonte que mata a sede está em outro lugar, outro corpo. Seus passos aumentam no lugar, suas pegadas macias e pesadas sobem a escada branca, seu corpo esguio sobe e sobe. Já posso escutar.
 Minhas mãos pingam de suor, eu posso ouvir. Meus ouvidos se aguçam. Meus olhos entre a tempestade de luz que golpeia da janela se afirmam na reentrância e afinam o foco. Um suspiro lento como um golpe no ar sopra dos meus lábios rachados causando dor e ardência. Vejo sua moldura alta, a forma brilhante de seu corpo branco. Seus olhos brilham no sol. Suas mãos nos bolsos, sua boca vermelha e úmida. Até que enfim, você chegou.

   Annabel Laurino.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Preciso de Alguém...

Preciso de alguém que tenha ouvidos para ouvir, porque são tantas histórias a contar. Que tenha boca para, porque são tantas histórias para ouvir, meu amor. E um grande silêncio desnecessário de palavras. Para ficar ao lado, cúmplice, dividindo o astral, o ritmo, a over, a libido, a percepção da terra, do ar, do fogo, da água, nesta saudável vontade insana de viver. Preciso de alguém que eu possa estender a mão devagar sobre a mesa para tocar a mão quente do outro lado e sentir uma resposta como - eu estou aqui, eu te toco também. Sou o bicho humano que habita a concha ao lado da concha que você habita, e da qual te salvo, meu amor, apenas porque te estendo a minha mão. No meio da fome, do comício, da crise, no meio do vírus, da noite e do deserto - preciso de alguém para dividir comigo esta sede. Para olhar seus olhos que não adivinho castanhos nem verdes nem azuis e dizer assim: que longa e áspera sede, meu amor. Que vontade, que vontade enorme de dizer outra vez meu amor, depois de tanto tempo e tanto medo. Que vontade escapista e burra de encontrar noutro olhar que não o meu próprio - tão cansado, tão causado - qualquer coisa vasta e abstrata quanto, digamos assim, um caminho.



Caio Fernando Abreu

quarta-feira, 13 de julho de 2011

terça-feira, 12 de julho de 2011

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O mar era verde
As árvores eram laranja
As folhas voavam
Tudo voava
As ondas giravam e corriam
Os pássaros brancos cantavam
Acompanhavam as ondas do mar verde
As flores brotavam
Um riso sorria
Teus lábios vermelhos
Tuas mãos macias
Desciam
Desciam pelo meu corpo
Enquanto o mundo grunhia.

Annabel Laurino.

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As vezes a água vai fluindo do meio de seus dedos
Escorregando
Caindo gelada pela sua pele crespa
Fazendo cócegas lentamente
Caindo e caindo
Você não consegue pega-la
Entre pingos vai caindo
Vai explodindo no chão
Você já não pode mais saber
Mas nem um pingo mais lhe resta em mãos
Nem uma gota qualquer que possa ter sobrado
Nem um vestígio
Nada, que possa ser lembrado.


Annabel Laurino.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Cicatriz

    Um brilho. Pequeno, muito pequeno, mas é nítido mesmo assim. Ele sai da pontinha redonda e achatada da sua caneta dourada refletindo na luz acima de sua cabeça e dançando no ar denso e quente e remotamente limpo. Que coisa engraçada! Eu nem o conheço.
    Mas seus olhos me olham assim e eu sorrio.
    Que coisa pare de fazer isso, eu penso.
    Eu não iria embora, se não precisasse ir.
    Mas eu preciso.
    Sua pele é branca, quase cinza, seus olhos são castanhos claros quase verdes. Suas mãos são compridas, brancas e gélidas e eu me pergunto por que você rói as unhas, por que seu cabelo é tão bagunçado e se a cicatriz no lado esquerdo de seu pescoço é seu único defeito.
    Não é uma cicatriz grande, é pequena, branca da cor de sua pele e ela nem parece uma cicatriz, parece uma distorção na sua pele perfeita, como se alguém houvesse lhe beliscado forte e puxado a pele para cima até marcar.
    E você me olha.
    Meus olhos estão marcados pelos seus.
    E agora nós dois fomos marcados por alguma coisa. Minha cicatriz é invisível. Branca e reluzente, apesar de que ninguém possa vê-la. É uma idéia apenas, compartilhada da lembrança de te ver.
    E eu guardo aqui.

 
Annabel Laurino.




Todo mundo tem.

    Todo mundo tem medo de alguma coisa. Todo mundo, eu também.
    A pergunta espiralasse no ar, assim: “O que, que eu to fazendo?”
    Enquanto eu lambo delicadamente a ponta da colher suja de sopa instantânea de frango, ainda quente por que fora recém tirada da tigela, e fico olhando o filme em preto e branco passando no canal de filmes antigos e vendo aquelas cenas tão remotamente vividas mesmo pela falta de cor penso que as coisas estavam indo bem, eu estava indo bem... Mas...
    Há algo em mim, algum caminho suntuoso e singelo, secreto que nem mesmo eu conheço que diz “venha” quando eu já não posso mais resistir, me impedindo de caminhar até o ponto certo do modo mais fácil.
    Eu tenho medo só de pensar em estragar com tudo, sabe como é, perder as chances quando elas estiverem bem na minha mão. Daí, dez anos depois eu vou me tornar uma idiota amargurada parada na fila da padaria fumando um cigarro barato que amarela até os últimos fios de cabelo, vestindo uma calça de abrigo suja há semanas e um moletom de magas puídas esfarrapado e sujo de manteiga com a frente escrita “você sabe que me ama”, gritando com as pessoas e odiando a mim própria por ter sido estúpida e não ter feito as coisas certas enquanto ainda tinha tempo de fazê-las. Até mesmo a menção do pensamento em escrito faz a idéia parecer ainda mais aterrorizante.
    Eu tenho medo de um turbilhão de coisas.
    Tenho medo de passar a idéia errada, daí afastar. Tenho medo de caminhar por caminhos que não deveria caminhar pensando serem certos. Tenho medo de acordar em um dia pela manhã quando eu já tenha feito de tudo e me sentir... vazia.
    O medo paralisa. Esse é o problema. É aquela droga de matéria que você tem que estudar, aquele encontro para ir com aquela pessoa que você estava cuidando a mais de semanas, aquele emprego novo que surgiu, aquela chance de mostrar que você é capaz, aquele negócio pra fazer, aquela música nova para aprender... Então você sente que não é capaz.
    Mas, que droga, quem foi que disse afinal? Quem disse o que é errado? Quem disse que não? Quem disse pra parar? Quem?


Annabel Laurino.

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Você nunca teve aquela sensação de que as pessoas certas sempre acabam com as erradas, quando as certas estão, tipo assim, dez centímetros delas?



Annabel Laurino.



domingo, 3 de julho de 2011

Infinitas Possibilidades

    Eu gosto de pensar nas infinitas possibilidades de me tornar tudo aquilo que posso querer ser. Como mudar, me transformar, me reinventar. Gosto dessa idéia. De pensar que posso ser tudo, tudo que der vontade de ser.
    Mas enquanto penso isso, nas infinitas possibilidades do que me tornar, gosto de lembrar-me baixinho que dessa forma humana, física e emocional, está muito bem por agora. Está calmo e tranqüilo, está cabível aos meus olhos, uma forma confortável, uma forma que me agrada, que em aquieta.
    Mesmo sabendo que eu poderia mudar para qualquer coisa que eu decidisse ser, pensar que está bom assim, desta forma que me agrada, deixa a idéia de me transformar fora de questão. Por que me inquietaria olhar no espelho e ver um rosto brando que já não estampa mais o meu. Vislumbrar meu corpo e ver que dentro dele emoções antigas e segredos gostosos já não estão mais por lá.
    Seria como jogar as chaves no mar e não ter mais como entrar em casa.
Annabel Laurino.

Eu adoro.

    Adoro a forma como seu corpo magro afunda na cadeira quando você esta impaciente. Como seus olhos negros ficam distantes enquanto sua mente divaga, e como suas sobrancelhas ficam sérias e seus olhos circunspectos ao mesmo tempo que sua boca fica uma linha fina e reta quando você se irrita. Eu adoro seu cabelo e não entendo por que você vive o cobrindo. Adoro a forma que você fala e como você enxerga a alma das pessoas olhando lá no fundo dos olhos de uma maneira que posso me ver refletida neles.
    Adoro como você aumenta os olhos quando afirma uma idéia ou como seu rosto fica inundado de expressão quando você se sente entusiasmado com alguma coisa. Adoro suas mãos, são grandes e finas, e sempre geladas. Adoro quando você pega as minhas mãos, mesmo que de uma forma inocente, mas elas ficam lá, sobre as minhas impulsionando a minha pele na sua em um toque que somente eu mesmo reconheço. Adoro como você meche o corpo enquanto caminha e como você me olha quando acha algo completamente absurdo no que falei. Quando você ri seus dentes retos aparecem e uma gargalhada em floreios forte e viril perpassa sua boca perfeita e rosada. Adoro seu cheiro, é como um cheirinho de lar que da vontade de repousar o rosto em seu peito e roubar suas roupas para mim, um cheiro que me faz querer te abraçar, que me faz pensar loucuras sobre dizer o que não devo dizer. Adoro seus defeitos, que me irritam e me causam coceiras sobre o corpo, como quando você teima com alguma coisa que eu digo ou quando você ignora e vira o rosto pra fingir que não ouve. Eu adoro seu modo infantil, que me irrita, e adoro o modo como penso que um dia você possa amadurecer.
    Adoro seu modo “eu não ligo”. Como também adoro quando você se estressa e fica louco. Adoro deitar na cama e chutar as idéias de você pra longe e sorrir quando elas insistem em voltar. É como uma coisa abstrata que eu guardo sozinha sentada no chão do meu quarto.
    Ninguém precisa saber.
    E eu adoro isso em você.

      Annabel Laurino.

A vida é Frágil e Absurda...

    Onde foi que eu li isso?
    Eu não lembro.
    Mas que seja...
    Você acorda, você dorme, as coisas seguem, os relógios acompanham o passo da pressa do dia a dia, você não vê as coisas passarem, é inverno, é verão o cenário muda você está sempre lá, sentado sobre uma cadeira gelada, desligando-se das folhas que apinham-se no chão a sua volta, as crianças brincam no parque, o som das falas se misturam as batidas se seu coração solitário e frio, a desenvoltura do momento morreu e um botão que antes era ligado á uma luz que pendia a vida, a noção das cores e dos sentimentos está empoeirado dentro de você. Sem nunca mais ter sido tocado, nunca mais ter sido visto.
    Mas a vida é frágil. Porém absurda.
    Você está lá sentado sobre a cadeira fria, o céu nublasse acima de sua cabeça cheia de pensamentos perdidos e sem nexo, o céu gira com rabiscos de frio e granizo, daí uma coisa absurda acontece.
    O botão dentro de você é arremessado longe, muito longe, para onde seus olhos não podem ver. Ele é cruelmente apertado, instigado por mãos puras e destinadas a isso, você corre e corre e não alcança. Nos relógios, os ponteiros parecem correr mais rápidos mais dessa vez no sentido certo e favorável. As cores explodem no ar como pequenas balinhas de multicor sendo misturadas ao sol. Daí é assim, as mãos puras possuem um corpo, incríveis olhos brilhantes e afáveis, e um coração tão mais solitário que o seu.
    Eu digo absurdo por que é incrível o caminho que a coisa vai.
    Sua mão possui outra mão agora, quente sobre o calor das cores que lhes envolvem, e mesmo que um dia um borrão cinza transpasse o céu, você terá um corpo tão mais sedento e cheio de sabedoria tal igual ao seu, e já não se sentira mais tão só.


   Annabel Laurino