quarta-feira, 17 de abril de 2013

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"Tá chovendo dentro dela, quase que um temporal."

Rêves Silencieux

    Tem sido aquelas noites em que o sono não chega. Ele simplesmente nega o convite com as portas abertas e cheiro de vela perfumada e cobertores quentinhos. 
    Tem sido do tipo de noites em que a impressão que dá é que o sol se esqueceu de acordar. Tarde ou cedo de mais, tanto faz. E faz um silêncio por aqui. O tipo de silêncio que te faz pensar em tudo, em todas as coisas.
    E eu penso no desejo continuo de não estar mais só um dia. E são nessas terríveis horas que percebo o quão sozinha é possível estar quando a sua unica companhia é você e unicamente, você mesmo. Os pensamentos ficam martelando fundo na cabeça, da uma vontade desesperada de sair dessas entrelinhas e começar a escrever logo com letras maiúsculas e em negrito, para que todo mundo entenda logo o que eu estou querendo dizer. Mas eu não sei bem como fazer isso, as vezes é meio como prender um grito depois de ter batido o pé na quina da cama. Insuportável e doloroso. Mas necessário sobretudo.
    Não estar aqui, só não estar aqui. Fecho os olhos e junto os cílios. Me leve para qualquer lugar que não aqui. Hoje será Paris. Que tal? Então eu me cubro com as cobertas e mudo de lado, abraço o travesseiro, me aqueço, noite fria. Paris. Estamos no Louvre, que típico, dia bonito, batemos uma foto e sorrimos. Tão turistas, todos a nossa volta pensam, mas ninguém liga, é um dia bonito.
    Não importa mais estar sozinha ou não estar. O problema é quando estou aqui, como agora, só comigo mesma e não tenho ninguém para compartilhar esses pensamentos todos que ficam me incitando cruéis. Ninguém para repartir um sonho do lugar favorito sendo visitado hoje antes de tudo virar de fato um sonho. Ninguém para admitir quanto medo. Para olhar nos olhos, abraçar o corpo e dizer que sorte te ter aqui agora enquanto tudo lá fora é só silencio e todos eles esqueceram do que realmente importa. 
    Penso em levantar da cama a essa altura, em fazer um café, em arrumar a sala e esperar o sol nascer e ser a hora de mais um dia de caminhadas e conversas com senhoras desconhecidas de meia idade me contando de como seus netos são maravilhosos e como não entendem quando seus filhos se tornaram tão ingratos.
    Eu não quero chafurdar aqui, nesse silêncio. Mas no final de tudo, tudo será um esquecimento. Não faço mal uso das palavras, eu só não tenho no que me apoiar agora. Eu não levantarei ainda, eu ficarei aqui por mais um tempo esperando a sonolência chegar e quando enfim chegar eu estarei cortando o vento com os meus cabelos, numa avenida qualquer de nome difícil, sentada em um café, do lado de fora, admirando o dia, as pessoas, o céu azul de Paris, comendo um croissant e ouvindo o burburinho animado de um francês fluente e perfeito. As pessoas serão bonitas e perfumadas, tal como manda o figurino. Eu sorrirei enviesado, tomarei café e lerei um livro. 
    E nada mais será só silencio. 
    Exceto o que ainda fica em mim.
  





Annabel Laurino