quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Erase

    Me pergunto se é possível fazer com que você volte a atuar na minha vida. Quero dizer, de verdade, a pegar o seu papel de volta com o diretor e os produtores do script e roteiro. Eu mesma dou a maior força. Vai entrando e exigindo seu papel principal de volta, sem nem querer saber, deixa isso de ser coadjuvante, isso não é pra você meu bem. Qualquer pessoa sã que desfrute de um mínimo de inteligência e te veja ao meu lado sabe que o seu papel na minha vida não é assim de poucas falas e poucas cenas. 
    Foi por isso que acordei vendo aquele filme que assistimos juntos uma certa vez e com uma vontade louca de te ligar, de me jogar sobre o telefone e discar logo o seu número. "Estou urgente de você.". Eu diria. Mas pensando bem, não seria assim uma frase de efeito tão boa, algo que aquela mulher vulgar no filme falaria. Não quero parecer vulgar, quero parecer com saudades. Então repenso, solto o telefone, me remoo de vontade e volto a fitar o filme séria, calada. 
    De toda forma, é a mais pura verdade que me vale agora, que estou urgente até mesmo dos seus fios de cabelo até aquele seu jeito irritante de me tirar do sério.
    Por que motivo mesmo é que você não volta?
    Ah sim, a vida deu alguns retrocessos nos últimos tempos, nos dividiu ao meio de nós mesmos. Quem se importa? Eu me importo! É por isso que sinto falta todo domingo e tenho vontade de abrir um buraco no meio do parque só para que eu possa me jogar dentro e sair de lá só quando janeiro voltar limpinho com um novo ano.
    Mas Ano Novo me lembra você. Janeiro também, verão, nós dois mortos de calor comendo sorvete no meu quarto e com o ventilador no máximo enquanto você tirava proveito dos meus vestidos coloridos.
    Um outro planeta talvez? Levem-me para Marte, Saturno, Vênus, Lua, sei lá. Talvez lá não exista você e nem mais qualquer vestígio que me faça lembrar você. Mas o que eu faço com as lembranças encravadas no peito? As engulo.
    É o que tenho feito desde que tudo isso me desestabilizou. Engolir e engolir, no more. E o tempo vem passando como se me arrastasse para qualquer caminho, que eu tenho trilhado sem nem perceber. É uma surpresa todos os acontecimentos e de repente eu só vou fazendo o que me mandam fazer e em outros momentos eu tomo as rédeas, eu violo os vícios, eu quebro as barreiras, eu jogo foras suas fotografias, digo que te esqueci, eu minto, eu me convenço, eu me desperto, me desespero. Mas depois eu me flagro te saudando de saudades, eu me interrogo, eu me distraio, eu me lembro.
    Ultimamente ando desejando uma clínica médica como no filme Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças. Apertar um botão e tudo seria esquecido prontamente.
    Mas é então quando eu me lembro do final do filme, de como tudo não funcionou. E eu tenho novamente a vontade imensa de ter a oportunidade de apertar um maldito botão para te excluir imediatamente só para saber se com você, se dessa vez, iria funcionar.
    Só que eu já sei a resposta. Eu já sei como tudo termina.
   





Annabel Laurino