Dizem os meteorologistas
que a primavera chegou. Dizem os ambientalistas que estamos em uma fase de transição
cuja ocorre raramente em um período de anos, esse em especial é um ano louco, é
verão no inverno, inverno invadindo o outono, o outono invadindo a primavera e
a primavera abocanhando o verão. Coisa de doido mesmo. Mas os meteorologistas
afirmam que isso é normal, é o ciclo de transição do globo terrestre para poder
se estabilizar.
Mesmo assim as
flores brotam lá fora da minha janela, no topo de uma arvore alta que alcança
as telhas e fica bem na vista. Mesmo assim parece que todos os animais estão
procurando um par por ai, e os casais parecem mais animados, os que ainda não
formaram um, estão procurando um par por ai. Tudo como manda o cronograma. Só
que os casais estão se desfazendo aos poucos e muito rápido. Pera ai, o que?
Não estamos na primavera?
As regras foram
quebradas esse ano, meus companheiros. E os casais, na primavera, quase não
existem mais. É tão inédito quando sorvete Negresco no supermercado. Os casais
primavelescos estão em extinção. As pessoas querem ficar só.
Claro, os
psicólogos dizem que isso é normal. É uma fase de transição muito compreensível
afinal o ser humano anda muito independente. Homens e mulheres preferem morar
sozinhos e os jovens preferem curtir. Ninguém quer mais saber daquele troço
antigo e muito out que os avós da gente diziam que era amor. Isso só acontece
no carnaval, com confete e samba da Ivete Sangalo ao fundo. E como os caras
estudiosos afirmam, é uma situação normal, vai se estabilizar.
O que houve com as
pessoas eu não saberia dizer. Astrólogos dizem que o clima fora dos eixos
desencaixa-se do plano astral, interferindo nas áureas humanas. Os astrônomos
arriscariam dizer que a estrela mãe está com vibrações radiativas de alto nível
que estão causando problemas sobre os nossos cérebros e claro, o clima. Os
ateus estão isentos sobre as informações, não acreditam em nada.
Eu, bem eu não sei
o que eu acho disso tudo. É tanta flor querendo voar e tanto pássaro querendo
correr. É tanta gente caminhando para todos os lados. Os vovôs e vovós dizem
que tudo é culpa da ‘internetilização’. Quando criaram os fones de ouvido
então, acabou o romance, ninguém mais quis saber de ouvir o que os outros tinham
a dizer e todo mundo se enfiou nos seus casulos.
Transição é fase
repleta de mudanças, bem como todos sabem. Eu mesma sou um ser puramente de
natureza transitória. Mas ultimamente da uma saudade dos velhos tempos, não
digo do tempo especifico, mas quem sabe do tempo do vovô e da vovó mesmo. As
primaveras eram frescas e cheias de flores e as pessoas paravam nas ruas para
se cumprimentar, para comentarem sobre o aroma das flores e frutos da cidade,
sobre o céu limpo e azul, os verões eram longos e quentes e os invernos
recheados de grossas roupas, longos casacos, chuvas temperais acumulando poças
pela cidade e homens cavalheirescos auxiliando belas damas a atravessá-las.
Cadê os beijos
roubados? Onde foram parar as cortesias, os investimentos de um romance prestes
a engrenar, os pedidos de namoro com cartas e flores e os bombons do dia dos
namorados? Onde está a primavera, aliás, perdida por ai em algum canto do mundo
incapacitada de se achegar sobre nós loucos? Eu nem vi as flores que dirá o
amor! Onde foram parar as boas musicas e o céu limpinho lá acima, e beijo na
mão com faces rubras, cadê o amor minha gente? Cadê a beleza de tudo isso?
De tantas pessoas
analisadas na história, uma criança de cinco anos disse que amor ta aqui oh,
aqui dentro, desse peito da gente. Olhando lá pra dentro nem com mil olhos eu
posso ver, garanto que ninguém pode, mas manda essa gente toda começar a
senti-lo por ai, a começar a amar um pouquinho vai, quem sabe assim, a
primavera aparece, recuperada e forte depois de sua crise de depressão, não
tendo mais corações para inflar e flores para brotar, depois que todos
esqueceram-se de apreciá-la, de se inspirar, de sonhar. “Que coincidência é o
amor!”.
Annabel Laurino