Quando eu estou só, nunca me sinto só. Tenho uma estranha
tendência a abrir as janelas, a ligar a música a todo som, a estender a mente
para muito longe e repousá-la, como a um tapete a muito tempo guardado sobre um
sol muito quente. Como se ela precisasse tirar a poeira, limpar, esvaziar,
pegar um ar.
Nesses momentos em
que estou só, aguardo sentada na cadeira do meu quarto. Descalça, quase não sinto frio. Posso ficar nua, como tiver
que ficar, não sinto nada. Minha pele é como uma cobertura tênue e infalível,
não passa frio, não sente frio. Por fora estou assim. Embora que por dentro
sinto-me em um caos gritante, milhares de pensamentos, de duvidas, de questões
me arrebatando, me bombardeando de todos os lados. Eu sei todas as respostas.
Sei que posso ignorá-las, mas não devo. Não vou.
Por isso as guardo
no peito, abro a minha caixa secreta, e nua como nua, a pele quente tão quente,
me vejo chorar, sei que se eu quisesse acreditar poderia crer que era fraca
para te deixar. Mas não sou amor.
Sou frágil, sou
eu. Sou só. Mas ainda sou eu. Frágil e nua, frágil por fora. Tão forte por
dentro. Não sou como você. Sei onde está o ponto, sei onde se encalça a dor,
sei onde tudo termina e sei sair do caminho quando bem me convém.
Me convém agora.
Convém-me estar só e não necessitar de nada. De calor, de corpo algum para me
aquecer. Não necessito. Necessitava. Agora tudo que passou entre agente
parece-me vago, sem sentido.
Em que caixa
perdida, em que corpo eu estava, em que mundo foi deixada a minha mente, para
que eu acreditasse tanto nesse amor?
Nesse amor vazio, que eu mesma criei, pintei,
bordei. E que agora reparto sem dó. Descosturo as linhas que ligavam-se tão
feiamente, sem sentindo, sem cor, e olho-me no espelho. Sim, estou
definitivamente só. Parece até que você nunca esteve aqui. Parece até que você
nunca existiu.
Annabel Laurino.