E nesse vazio tão grande e inerte, sinto uma mágoa descompassada. Não sei. Me sinto ferida. Como se fosse ainda muito frágil e pequena. Sinto que por dentro de mim, entre minhas entranhas, uma criança muito pequenina, de pouca idade e muita inocência houvesse levado um tapa muito forte, e isso a feriu. E ela chora. Todos os dias. Vezes são gemidinhos baixos acompanhados de leves choramingos. Mas ela nunca esquece. E dias ou outros se lembra tão remotamente e tão intensamente daquilo que lhe feriu que aos berros clama, e chora, e se deleita agressivamente dentro de mim. Fico sem comer, sem ver, sem pensar. E isso me acompanha constantemente. Todos os lugares que vou á uma choro dentro de mim que nada cessa. Na madrugada fria esse choro rasga no silêncio como uma sirene de uma ambulância, despertando todos os sentidos. Com carinho tento acalmá-la, mas ela chora ainda mais, e berra, berra muito. Por que não sou eu quem deve acalmá-la, não é de mim que vem o alento.
Nunca me esqueço do que há lá dentro. E tento abrandar, e tento de forma madura andar em frente, fingir que nada sinto, nada vejo, mas parece sempre pior. Já não sei o que faço. Essa armadura de ferro por fora de mim aos poucos vai enferrujando, vai perdendo as suas partes e temo o tempo todo de que essa fragilidade por dentro resolva sair e tomar conta do lado de fora. Tenho muito medo de cair em profundo choro, de voltar atrás, de demonstrar essa magoa, ou até mesmo de tentar curá-la.
Annabel Laurino.