sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Intervalo


    A bola branca girava de um lado a outro na quadra e raspava o couro brilhante pelo sol no asfalto de cimento seco e áspero enquanto o garoto chutava a bola. A menina amaciava seus cabelos dourados, enquanto sua amiga estourava a bola de chiclete sobre os lábios carnudos e rosados. O som perpassava as falas. Todos falavam juntos. Alguns corriam, outros comiam, outros conversavam e jogavam. Em seus casulos de seus corpos quentes o estres do dia cálido dava uma pequena pausa. Era o ápice, a folga que todos ansiavam, os quinze minutos perfeitos daquela tarde languida e causada.
    Analisei os raios do sol agitarem nas vidraças das janelas e depois as sombras dos corpos em ação na quadra. Negras, se bem focadas eram até... Sinuosas.
    Senti uma brisa fresca cortejar meu rosto, minhas mãos abraçaram meu corpo e me debrucei sobre a janela larga. Nada no mundo me faria mais feliz do que tê-lo por inteiro naquele momento.
   Lembranças de um ano trás assaltaram minha memória como um ladrão assaltando uma casa de repente. Me vi refém de mim mesmo. Rapidamente o intervalo calmo e tranqüilo tornou-se um tormento.
    A brisa fresca e macia acariciou-me por mais um tempo até cessar. Senti o cheiro do meu corpo limpo e me deliciei lembrando do seu cheiro, sem querer, só por lembrar. Foi como sucessivas atormentações á mim mesma.
   Eu não queria, mas fiz mesmo assim. Lembrei de tudo. Lembrei de você e de mim. Lembrei de nossas brigas e dos momentos bons, lembrei das falhas e dos motivos, das negações e das noites em que passávamos deitados ligados em se olhar, somente ouvindo um a respiração do outro.
   Não teve como evitar. Você me arrombou. Adentrou dentro de mim e fez um estrago.
    Naquele intervalo eu já estava meio que perdida, sozinha estava na sala vazia debruçada sobre uma janela larga admirando os outros corpos felizes, aqueles que por algum motivo diferente do meu lidavam bem com o fato de curtirem o momento, de não terem que afogar suas mágoas sozinhos em um canto ou até mesmo de sentirem a necessidade de estarem sozinhos. Admirei o fato de todas aquelas pessoas se sentirem livres enquanto estavam pressas em um prédio absurdamente irritante abarrotado de normas.
   Tudo que me veio na cabeça foi que eu precisava sair dali, mas a preguiça exagerada e a falta de imaginação me puseram a pensar, “para onde então?”. Eu não sabia. Mas sabia que me serviria qualquer lugar.
   Andando pela avenida, pelo calçadão, olhando as lagoas cheias de história da praça ou sentada em um banco lendo um livro. Qualquer lugar.
   Se eu pudesse estar com você e pudesse ver seus olhos nem que por um instante, se eu pudesse retirar de mim essas questões incrivelmente necessárias e causadas pelo encontro que tivemos no dia anterior e colocar tudo em prática, resolver e partir sem mágoas, então eu poderia me sentir melhor... Seria como um... Intervalo, uma forma de me intercalar de mim mesma, e sobrepujar emoções. Dar um tempo de mim. Respirar. Entender.

Annabel Laurino.

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Ia escrever sobre você de novo. Desisti.
Tenho perdido muito tempo com você.
Tenho perdido todo o meu tempo com você.
Me perdi em você. Perdi você. Agora me perco por você. Perco todo meu tempo com você.
As vezes perco meu tempo me perguntando se tudo isso é só perda de tempo. Será que você perde seu tempo comigo?
Isso não é sobre você. Isso é sobre eu tentando pensar em outras coisas.



PC Siqueira