quinta-feira, 4 de abril de 2013

Guarda-Chuva

    E Zé, me diz, é tão egoísta querer que alguém se apaixone pela gente? Porque eu ainda não consigo crer o que leva uma pessoa que tem o amor de outra nas mãos o jogar fora. Será que não desconfiam da tamanha sorte que tem ao serem amadas? Olhe o mundo Zé. Olhe para ele. 
    Acordei essa manhã e não tinha sol. Passou o dia com chuva e aqueles cafés quentes e extremamente fortes. O coração latejou. Eu pensei nas pessoas sortudas com o amor ganho. As pessoas que tem alguém para dividir o guarda-chuva em um dia desses e ainda roubar um beijo enquanto caminham, alguém que se preocupe se elas irão se molhar ou não ao sair do trabalho, alguém que irá recebe-las com braços quentes ao final do dia e perguntar como foi a tarde longa de tarefas árduas. Alguém que as leve para tomar café da manhã. Alguém para viajar, para ver filmes abraçados, rir de bobagens, compartilhar segredos. Alguém com ombro amigo para chorar e abraço forte para sustentar a tua luta diária quando tudo se mostrar difícil. 
    Zé, eles não sabem da sorte que eles tem.
    Eu te falei sobre o mundo... O dia hoje tão cinza e escuro, daquele jeito que você sabe que eu gosto. Mas é verdade que dias assim me lembram muito da falta que a companhia de alguém faz. Lá fora não era só a chuva batendo firme, era também a loucura toda, o vício e a fome, a solidão dos corações gelados. Sabe, quem tem um amor assim, tão grudado e causado e bonito e gentil, não deveria reclamar de nada, na minha opinião. Zé, tem coisa mais linda do que enlouquecer nesse mundo com a certeza de que você não está só, de que se você morrer em dois minutos você não morre sozinho? A vida as vezes tão insana, mas olhe, existe ainda o amor. 
    Quando vou ter esse amor, Zé? Falta muito, até quando? Hoje, vendo aquela chuva toda e aqueles casais embaixo daqueles guarda-chuvas, juntos e encolhidos, os passos apressados enquanto corriam para qualquer lugar, eu desejei ser um deles e provar esse gosto de favo de mel que os afortunados tem e eu ainda não, sei lá porque. Desejei ter alguém que me amasse tanto a ponto de engolir as próprias dores para me buscar do lado de dentro de mim mesma e me mostrar o mundo. Eu desejei ser alguém assim e ter alguém assim para mim, Zé. E ainda me atordoo em saber que tem gente feliz e nem sabe. Tem gente com a paz como amiga e nem desconfia.
    Será que chove aqui qualquer dia desses? Ein, Zé? 
    Será que eu ainda vou poder abrir meu guarda-chuva?





Annabel Laurino


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"Minhas obviedades possuem mapas complexos." 





Caio Fernando Abreu