Ela, caminhando daquele jeito pomposo como uma coruja sábia, em uma manhã inesperadamente muito fria, o vento gélido e arrepiante subindo sobre as mangas do casaco jeans dela, encarapitado e malicioso ele lhe subia pelas orelhas e lhe beijava a face, mordiscava a ponta de seu nariz e deixava aquela pequenina marca avermelhada. Ela, que quando abriu a porta para sair a rua e encontrou seu velho amigo, mal pode acreditar. Era ele, seu velho irmão que lhe inspirava, lhe saudava, e que ela, como sempre, passara os dias ensolarados e quentes esperando.
Até que enfim, até que enfim! Mal podia traduzir aquela sensação. O ar gélido lhe açoitando os cabelos, os passos apressados e curtinhos, as mãos como cubinhos de gelo. Meu Deus, pensou, como seria boa sentar na varanda de casa agora mesmo, a máquina de café ligada, uma caneca quente entre as mãos e abrir um livro. Opa, lembrou-se, foi isso mesmo que recém acabei de fazer...
Descobriu-se feliz demais. Uma ligação no meio da rua fria lhe interrompeu os pensamentos e junto ao encontro de seu amigo estava a voz dele, do outro lado da linha, em algum lugar um tanto longe dela ele degustava do mesmo sentimento, dizia que sentia saudades dela, e ela sentia dele, claro. Acima de tudo, nada poderia ser mais perfeito. O outono enfim havia mesmo voltado. Seu velho amigo voltara. E ela tinha um amor quente no peito que pela primeira vez na vida, não batia voluntariamente.
Em pensar que passamos uma vida inteira para descobrir o que é felicidade, sem saber que ela nasce em dias, dias como esses.
Annabel Laurino.