sábado, 12 de março de 2011

Estranheza Aguda.

    Ah é estranho, mais uma vez. A cafeteira gorgolejando, como engolidos fortes e abafados, soltando no ar um aroma perfeito de um café forte e quente, quase pronto. A chuva despencando do lado de fora, como um véu que encobre a vista por fora da janela. O céu nublado, as arvores com suas cores apáticas, amarronzadas, as folhas caindo, encharcadas. O cheiro amadeirado no ar, cheiro de terra molhada. Os pássaros pararam de cantar. Um frio estranho na barriga. Um sentimento de estranheza lhe abraça por trás.
    Um friozinho no ar, as poucas roupas de verão fazem parecer estupidez em estar vestindo-as. Você acabou de ver umas noticias horríveis na Televisão, acabou de saber que o mundo está em crise. Você sente um horrível sentimento.
    Você quase se sente histérica, á ponto de correr para o telefone e telefonar. Para ele.
    Só para dizer que se algo acontecer você gosta dele, que você quer que ele fique bem, que ele esteja bem, que tudo esteja bem, que ele fique em paz, que se cuide, que avise se algo não tiver legal. Você quer dizer, “Se algo acontecer...Eu preciso dizer...”
    Você se sente estúpida, claro, por que tanto alarde? Por que tanta preocupação se nada aconteceu?
    Mas... E se acontecer?
    Medo.
    Medo de não poder dizer, de não poder escutar aquela voz tão causadora de saudades dentro de você, só mais uma vez.
    Ah que estranho isso tudo. Isso que passa na sua cabeça.
    É um sentimento estranho. Você sonha com ele quase todas as noites, sente tanta falta.
    Você sabe que ele está em outra, sabe que não pode, que não deve.
    Mas por que quer tanto, depois de ter feito tudo, ter recolhido tantas forças para ter jogado todas as lembranças fora?
    Por que há dentro de você um sentimento como uma bolinha de papel que fica inchando e murchando, pulando, se contorcendo, instigando, lembrando, arranhando no seu estomago, dizendo, dizendo que você precisa vê-lo? E por quê?






Annabel Laurino.

A Terra Grita, o Mundo Grita

 Texto escrito no dia 11/03/11  

     Você não precisa de imagens concretas e bem nítidas para definir bem um pensamento do que acontece agora, nesse exato instante no mundo. Por isso suspendo fazer um texto com fotos dos acontecimentos que relato. Não é uma noticia, é um simples comentário que, talvez, sem valor.

   
    Neste simples texto vou expressar uma idéia passageira, que diferente de uma reportagem na televisão eu mostro com toda a minha humildade um pensamento nítido, simples, básico e lúcido do que nesse exato momento acontece bem ao meu lado.


    Você acha que nada pode lhe acontecer, o mundo inteiro despenca em meio a milhares de litros da água, esgotado de mortes, de pessoas inocentes, de pessoas que em um dia qualquer acordaram para viver, para trabalhar, para estudar, para viajar, para encontrar um amor, um novo amor, para reencontrar alguém, enfim, em um dia qualquer, com tantas coisas, com tantos planos e sonhos, que em um incidente catastrófico tudo, simplesmente tudo se desfaleceu.
    Vivemos em um mundo real, um mundo onde bem dizia Cazuza “Seres humanos vivendo como bichos”. Somos literalmente animais, vivemos em selvas, perigosas, que explodem, que tremem, que se enchem d’água, que engolem agente. Destruímos nossa casa, nossa família, nosso fascínio é o dinheiro, e o nosso nome, é ganância.
    Que triste que lamentável, você liga á televisão em uma manhã de sexta e pega o jornal anunciando, nitidamente, como um soco no estomago. “Terremoto no Japão, Tsunami, pessoas mortas, desaparecidas” as imagens brotam na tela da TV, um horror, um pesadelo, pessoas dependuradas em postes, em prédios, abanando as roupas pelos carros implorando socorro enquanto uma manancial de água as engole aos poucos. Barcos sendo arrastados, carros, casas, pontes, como se fossem brinquedos de plástico.
    Que horror.
    Certo dia na escola, minha professora de História perguntou para a turma sobre o Brasil, sobre as velhas frases do Renato Russo, “Que País é esse?”. E eu pergunto “Que mundo é esse?”
    Que mundo é esse onde vivemos, que se escolhe matar ou morrer? Que coisa mais triste, você acorda em uma manhã e mesmo que você saiba que o horror está lá, do outro lado do mundo, a pergunta surge, “mas poderia ser comigo, não?”. Sim, poderia. Eu poderia estar lá. Vendo aquela torrencial de água vindo em minha direção. Para que lado correr? Para onde ir?
    Pode parecer dramático leitores, com certeza posso estar sendo dramática de mais, mas por favor, não finjam que isso não acontece. As pessoas fingem que só por que está do outro lado do mundo, aquilo não pode acontecer com elas.
    O que nos faz pensar que somos melhores do que alguém para que isso não aconteça com nós?
    Somos medrosos, temos medo, medo que aconteça, de que de repente o mundo resolva sucumbir e não reste vida para contar história. As pessoas, o mundo inteiro, temem.
    Claro, claro que existe a solidariedade, pessoas que se comovem a dor roupas, comidas, materiais de higiene, mas por medo. Medo de que um dia venha a acontecer com elas.
    Estamos vivendo em um mundo onde nem mais em nossas próprias casas encontramos segurança.
    O que era nossa maior aliada para nos favorecer conforto, agora, nos ataca. A Natureza revoltada, os vulcões com suas bocas enormes despertando do sono de anos, as gelereiras derretendo em um calor fora do normal, a terra gritando.
    Que horror.
    Que realidade triste que vivemos.
    Deixo, esse texto, pedindo condolências á todas as pessoas que hoje estão sofrendo em custas de milhares de coisas que se arrastam durante anos. Ninguém quer falar sobre isso. Ninguém quer dizer que é culpa de nós mesmos, de nossas invenções, todos querem justificar algo, estudar e explicar. Mas no fundo não há explicação, somente Deus sabe por que isso acontece, e no fundo entendemos que talvez seja o fim, por culpa de nós mesmos.
    Peço minhas condolências as pessoas de São Lourenço do Sul, tão perto daqui de Rio grande, Que Deus as proteja, a fé e a única esperança.
    E as minhas condolências as pessoas do Japão. Longe, não importa, aqueles que não se fazem cegos podem ligar a televisão, todos sabem que a realidade está tão próxima quanto menos de um palmo de nossos próprios narizes. As famílias conhecidas do Rio Grande do Sul, que possuem parentes no Japão, também peço condolência, e digo “Força”.
    Sinto muito leitores, sinto escrever sobre algo tão triste e tão real.
    A verdade é que ontem quando liguei a TV e assisti sobre as noticias de São Lourenço, me peguei pensando, “Poderia ser aqui”. E essa realidade é tão grande, ver aquela cidade que um dia tão inteira e depois tomada por água, é triste. Sinto muito pelas famílias, pelos sonhos despedaçados, pelas vidas machucadas, sinto muito.
    E hoje, hoje quando vi sobre o Japão, vendo aquelas ondas imensas engolirem as cidades, foi como um pesadelo, que horror. É como se uma guerra houvesse devastado aquele lugar, vidas que antes haviam acordado para mais um dia normal se depararam com uma catástrofe, colocada como a sétima pior dos últimos tempos. Sinto muito, mais uma vez.
    Por favor, encerro esse texto, pedindo de coração, aqueles que puderem que tiverem oportunidades, ajudem, ajudem essas pessoas, você que mora perto de um local que faz arrecadações de roupas e etc. Ajude. Doe, faça a sua parte. Você que pode, nem que com uma muda de roupa, mas ajude.
    E pela primeira vez, em um texto nada tão típico de mim, eu peço á paz, que todos lutem pela paz. Lutamos por tantas coisas, por um trabalho melhor, por um dinheiro á mais no fim do mês, por uma casa melhor para os filhos, para mais comida nos armários, para um namorado(a) novo(a), sei lá, mas lutamos por tanto, que lutemos pela paz, que pode ser tão fácil, apenas com um gesto, um gesto simples, um sorriso, talvez, pode amenizar tanta coisa. Abracem seus irmãos, por que a verdade é nítida e muito bem estampada, vivemos, infelizmente em um mundo de guerra. Não temos mais tempo para dor, para rancor, para inimizades, para tão pouco. Temos tempo apenas para fazer valer a pena, por que hoje, não se sabe mais o dia de amanhã.






Fiquem em paz,
     Desejo todo amor, toda paz.


Annabel Laurino.

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    Quem diria que um dia eu estaria aqui rondando a rua passageira e trilhosa diante de mim, compassando passos, vendo todos esbarrando no meu ombro, não percebendo minha pequena altura, não ligando para mais uma alma óssea vagando as calçadas sujas e fedorentas dessa irritável cidade antiga, pequena e profundamente aprofundada. Como prefiro chamá-la, As Ruínas. Moro nas grandes Ruínas, bem perto do mar, onde ninguém pode me encontrar. Sou um feixe de luz que brilha do sol ao mar e depois explode no ar, sendo fisgado por globos oculares de visão, qualquer visão, uma visão qualquer. Milhares de olhos atentos nunca se quer me percebem e eu tão pouco os percebo também. Estou sempre viajando, quase nunca paro em casa, ainda que assim passe o tempo inteiro no mesmo lugar, sobre o mesmo corpo dês de que me conheço por viva. Sou tão estranha as vezes, mas estranho é esse mundo louco cujo qual não pertenço, cujo estampa tantos rostos, tantos sofrimentos cravejados em um olhar.
    Já não sei mais o que disser, já não me lembro como vim parar aqui, escrevendo isso tudo, talvez, talvez tenha sido um ato comum como respirar. Levei as mãos ao teclado e pensei “Quem diria que um dia eu estaria aqui...” E tudo simplesmente fluiu.


Annabel Laurino

Queria...

    Ser engolfada, sucumbida por algo. Queria, oh, por favor, só um pouquinho. Só um instante, só um segundo qualquer, sentir.
    Sentir.
    Sentir.
    Como uma injeção de sentimentos. Quero sentir!
    Alguém que me faça sentir algo, algo que não seja lembranças, algo que não seja saudade, algo que não seja dor.
    Algo que seja tão forte e arrebatador. Instigante. Incessante.
    Uma euforia caustica e borbulhante adentrando pelas minhas veias, fervilhando pelas células de meu corpo, minuciosamente se espalhando pelos centímetros do meu ser.
    Quero sentir.
    Quero um prato bem servido de muito amor, por favor.
    Nem tão quente, e muito menos frio.
    Bem temperado, mas não muito salgado.
    Um prato completo. Com direito ao prato principal, até a sobremesa.
    Quero ser instigada e calorosamente preenchida pela dádiva de algum sentimento fora de meu padrão rotineiro de dia após dia.
    Quero algo mais.
    Quero o corajoso que me faça sentir. Que me prenda. Que me instigue. Que me ame até o fim. Quero que   me arranque as adagas, fervilhe as profundidades corrosivas que me prendem em mim mesma, quero alguém que quebre as janelas, que quebre todas as regras.
    Que me prenda. Forte. Bem, forte.
    Em seus braços.
    Calor.
    Quero amor.
    Quero sentir a natureza infiltrada sem medo algum de sentir, por que quero mais que tudo saber como é viver de verdade.
    Quero sem sombra de duvidas sentir a realidade.
    Quero amor divino.
    Amor de verdade.


Annabel Laurino.



Afundando e Emergindo

    Um clarão, não tão forte como o brilho de lanternas de um carro no escuro. Não.
    Mas um clarão, de fato. Como uma bandeira de brilhos tremeluzindo diante do meu corpo presente que afunda. Afunda.
    Estou afundando agora. Outra hora, estou emergindo.
    Afundando e emergindo.
    Estou sentindo, o liquido se espalhando pelo meu corpo como uma caricia de véu, as lambidas aguadas egeladas que logo vão ficando mornas, me envolvendo.
    Adentrando meus ouvidos, minhas narinas, me encharcando por inteiro.
    Sou apenas um corpo presente no meio de tanto mar. Sou apenas um corpo.
    Afundando e emergindo.
    O sal do mar gradativamente gruda em minha pele como algodão encostado em tecido.
    Não há som.
    Nada.
    Sou só um corpo.
    Não há nem barulho de vento, nem de vozes. Nada.
    Como entrar em um quarto de água. Não se ouve nada.
    Quase e ainda praticamente imperceptível ouço as ondas quebrando acima de mim. 
    Ouço a maresia, o som  caustico e fervilhante, borbulhante e inebriante. Como um cântico celestial, como areia se remexendo em um tudo de vidro, de pés se arrastando ao chão lentamente, corpos se unindo, é tudo que eu consigo ouvir, e ainda assim tão silenciosamente como se de repente, eu não existisse. Como se tudo ficasse fora daquela pequena camada plástica que encobre a água, a tensão superficial. Como se dali em diante, adentrando eu não fosse nada mais.
    Um corpo.
    Afundando e emergindo.
    Eu vejo as luzes do sol entrando pela água, partículas de brilho se unindo ao verde vivo do mar.
    Eu sinto você chegar, chegando lentamente, sinto seu toque, quente preciso, sua mão macia afagando meu ombro. Posso ouvir até a sua voz, talvez por que escutei ela ontem no telefone, talvez por que ela já ficou em mim, e já faz muito tempo que muita coisa sua esta em mim.
    Sua voz se arrasta em meus ouvidos como o sal do mar se arrasta nas ondas, como uma espuma branca que quebra na maresia, arrastando-se. Segundos eternos.
    Meu nome, você diz meu nome. E tudo que eu quero é agarrar você, agarrar seus braços e puxa-lo para perto de mim até fazer com que tudo seja real, quero suplicar para que me retire de dentro da imensidão funda e superficial pela qual me encaixo sendo a cada segundo emergida. Quero gritar seu nome no meio da água. Desesperadamente. Inocentemente.
    Pobre de mim.
    Então o ar me falta assim, tão de repente, e como um impulso de sobrevivência já não posso mais emergir dentro do mar, e volto. Volto para o ar. Uma realidade me sucumbindo.
    Quase choro.
    Sons. O vento. As vozes, as risadas, as buzinas, as musicas, os outros seres presentes.
    Ah que pena.
    Você não está mais aqui.

    Encho os pulmões novamente. Tranquilamente, emergindo novamente sou engolfada de novo em um mundo de água, silêncio e calor.
    E novamente, os sentidos quase desfalecidos me encobrem rapidamente.
    O sol, a areia, as ondas, os corpos.
    Tão de repente, subitamente, já posso sentir você aqui. Você em mim.


Annabel Laurino.