Quero que você seja meu Jean-Paul
Sartre. Prometo a você que serei sua Simone de Beauvoir, porém com sapatos
franceses mais bonitos. Acaricio seu rosto com meus dedos pequenos, encontro um
plexo solar nas duas órbitas faiscantes com que me olhas, me admiras. Na
desconjuntura perfeita de um universo não muito distante, eu sou o que queres
que eu seja, você é o que eu quero que você seja.
Cantarolo no seu ouvido mais um
verso daquela música antiga, qual é mesmo o nome? Ah sim, sim, aquela em que
uma mulher louca canta. Por que sempre tem de haver uma mulher louca? Por que
todas as mulheres são loucas? Na minha estante de livros, você pode ver, dedico
um lugar só para elas, as loucas.
E do que eu estava falando mesmo?
Ah, sim... A música. Começo baixinho, cantando Dream a Little Dream of Me. E
você sorri jocoso, gosto dessa palavra, jocoso, e você sorri, sorri
bobinho, doce, com suas órbitas cheias de luz enviando mil ondas de calor pra
mim, seus dentes brancos brilhando felizes, tudo em você é feliz e eu fico
feliz também, quero dançar minha música com você, dividir a libido,
os ósculos, as frases soltas, o preto e o branco, o silêncio soturno, o doce e
o amargo, as hipóteses, as histórias, as verdades e as confabulações de um
futuro que nos espera. Eu quero o já que eu não posso ter e que talvez você
possa me dar. Quero o instante agora.
Penso em flores. Quando foi a
ultima vez que me deram flores? Esse ato tão bonito, tão fresco, o ato de
florear. Hoje em dia querem somente semear. Semeiam, semeiam, e semeiam, ficam
lá, jogando sementes e esperando no que pode dar. Mas ninguém se preocupa em
florear, enfeitar, deixar mais bonito, cativar.
E nessa de cativar eu afirmo: quero
cativar, quero que me catives. Você quer? Além das flores e da semelhança com a
Rosa eu sou sua raposa dentro da toca. Quero que me catives e aos poucos eu vou
te ceder o meu espaço, o meu todo, o tudo e o mais além desse universo que é
meu, só meu, mas que eu quero nosso, redesenhado com pontinhos trilhados pelos
dedos de nós dois. Eu desejo a esse mundo azul que seja nosso, meu e seu, como
já foi e pode ser.
Se tu vens, eu não sei, mas eu
sigo. Nas tardes de Agosto eu muito chorei, só que você nem sabe disso, eu não
te contei. Agora já passou, já deixou de ser. Agora tudo brilha novamente e com
cheiro de jasmim e alecrim, pois há um som melodioso que lembra minha música
favorita e que não para de tocar nos jardins da minha mente, me fazendo
acreditar que a primavera está chegando. Se não me floreias, aguardo, o futuro
há de me dar flores.
Chove nessas noites de início de
setembro, chove tanto que eu penso em te ligar e dizer que estou com medo, com
medo desse futuro incerto, mon dear, tão misterioso. E essa chuva, essa chuva
não para, trazendo um frio enregelante que sobe sobre a minha pele fresca de um
banho quente. Te escrevo um bilhete assinado da sua bonequinha que muito pensa
no que será, dizendo que estou com saudades, vem me abraçar, me guardar
nos braços quentes que tens, vem sussurrar pra mim aquelas
promessas frescas de que será eterno, eternamente em nossas mentes florescentes
e subjacentes para todo o sempre e sem fim.
Duas canecas de café. Uma para mim
e outra para você. Sentaremo-nos em uma mesa ao lado da enorme janela vendo a
vida que passará lá fora. Não, não é o CAFÉ DE FLORE, mas é aqui, nesse lugar, que
reside a história inteira de nós dois. Você abrirá o seu jornal e juntos nos
debruçaremos sobre as palavras cruzadas que ainda teremos para completar. Você
sorrirá, tentando esconder sem sucesso, as covinhas faceiras dos cantos dos
teus lábios que se esticarão e eu sorrirei te jogando um beijo
vermelho, suspirarei e pensarei que este seu sorriso sempre será o meu sorriso
favorito, independente do que aconteça.
Nesse dia, sentados nesse lugar,
ansiosos com as nossas histórias para contar, veremos a chuva cair lá fora e
uma multidão abrirá seus guarda-chuvas para se proteger, admiraremos os pingos
confeitados de luzes que cairão pela janela, escorregando jubilosos e sem rumo. Nos perderemos em nosso entretenimento favorito de sermos nós dois, você
bebendo das minhas curvas ondulantes e eu dos teus delineios pulsantes. Tudo
isso assim, tão Clarice e Caetano, para no fim, depois de pagarmos a conta,
felizes e faceiros, vermos um sol de quase dezembro temperado de saudade e um
arco-íres residir radiante, cheio de luz e som e com uma nova história pra
sempre nossa.
Annabel Laurino