Quero tirar uma
fotografia, agora, nesse exato instante. Mas não tenho em mãos uma câmera
fotográfica.
Por um
lado é até bom. Pois assim não me sinto culpada por não poder elucidar para você
os sons. Sim, não se pode fazer isso através de uma fotografia, não é mesmo?
Vezes ou outra,
lhe confesso, não ouço nada. Mais ou menos no momento em que a onda pequenina e
gelada toca gentilmente os meus pés, e cobre os meus dedos, minhas unhas
pintadas de laranja.
Fico parada aqui
numa sede imensurável de compreender como tudo isso veio parar aqui. Mas esse
sentimento é o mesmo de se estar apaixonado. Achar tudo incrivelmente mágico
porém sem poder entender qualquer detalhe do que se está sendo sentido, por
menor que seja.
A areia úmida
gruda na pele morna que se arrepia com o beijo do vento, o mesmo que embala e
sacode o mar. A espuma densa veste sua grinalda branca. As bolhas formigam e explodem
no ar. A ponta da caneta risca no papel em um arranhar nervoso e trabalhado, o
sussurro das ondas, cantando ao pé do ouvido. As crianças brincam e o cachorros
correm. Os músculos se movem no encalço do sol.
Uma paz de espírito
se apossou de mim.
“Deus é muito
lindo”, repito sem parar até que se possa entender nem que seja um bocado desse
sentimento tão abstrato.
Os pigmentos
esverdeados do mar reluzem todos juntos, e penso que estranho quando uma gotícula
sozinha, margeando em minha pele translúcida, perde sua cor, solitária. Olho
para o céu, cinza arroxeado, pelo final de tarde, brilhando feliz. Um navio com
suas luzes acessas navega lá longe. Arrasto os olhos pelo horizonte sem fim e
sinto uma alegria, um formigamento no peito. Eu vejo Deus sorrir para mim.
Annabel Laurino