sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

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"[...] Viver é feito de instantes, e não vive quem hesita por muitos segundos, sob pena de colocar a perder tudo que não ganhou. O que poderia ser uma nova história, não passou da continuação de algum capítulo enrolado e chato. Então quem sabe um dia. Vou continuar esperando alguma coisa dos meus dias, rezando contra essa minha inércia. Os dias vão passar, mas não vou me esquecer de ainda querer escutar aquele riso.”

 Gabito Nunes 


Sentir é muito lento

Os olhos da ingrata que nunca nos beija, 
a luz de um corpo que apaga os caminhos,
 os seios submersos da sereia. 
Todas as velocidades e vacilos do coração que, de tão lento, 
quase pára; ou solta faísca e incendeia o horizonte.
De quantas maneiras se diz o desejo?



Cacaso 

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Quando você quis eu não quis
Quando eu quis você não quis
Pensando mal quase que fui
Feliz.



Cacaso

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

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    "No que depender de mim (…) enquanto tiver saúde vou rolando até encontrar qualquer coisa (ou pessoa) tão fantástica que me dê vontade de ficar ali para sempre. Cá entre nós, se for só a morte, também não me importo nem um pouco."


 Caio Fernando Abreu



No que depender de mim (…) enquanto tiver saúde vou rolando até encontrar qualquer coisa (ou pessoa) tão fantástica que me dê vontade de ficar ali para sempre. Cá entre nós, se for só a morte, também não me importo nem um pouco. — Caio Fernando Abreu

oui, la marge de la vie

     Sobretudo eu me sinto muito só. E isso faz parte, quase todos os dias, de uma rotina de caminhadas melancólicas e o fato de admitir isso para mim mesma. E caminho, claro, para todos os lugares durante o dia, arrastando comigo essa sensação. O que é um peso, obviamente. Todos os dias me convenço de que já estou farta de me sentir assim, sobretudo só.
     Me perguntaram porque eu adoço o meu café e eu respondi 'somente quando a vida está amarga demais'. Tenho adoçado o meu café todos os dias ultimamente. Meio quilo de açúcar para cada caneca bem servida e me sirvo bem. Bem doce, quente, como a vida deveria ser. E não é. 
     O que me falta mesmo eu nem sei te dizer, talvez falte um pouco mais de mim em mim mesma, coisa e tal. Tem gente ai procurando Pilates, massagens terápicas para relaxar o corpo, ioga para tranquilizar a mente, e eu só queria um pouco mais de segurança humana, corpo quente, pra dividir o espaço junto comigo. 
     Então eu pensei, 'já basta, assim não dá, vamos mudar isso ai. Até porque meio quilo de açúcar para cada caneca que se tome é muito, e a vida não está fácil'.
     Em um momento revolucionário, final do dia, me pego surpresa, tomando café num copo de isopor, sentada em frente ao posto de gasolina em uma rua caótica de carros. Penso, se eu não estivesse aqui, onde gostaria de estar? Não precisei pensar mais do que um segundo. 
     Prometi para mim mesma, eu vou para Paris.
     É ambicioso, mas a ideia não é tão nova assim. Já faz muito tempo que esse sonho está guardado dentro de uma caixinha embaixo da cama, e de uma vez por todas a ambição e a vontade de fazer falaram mais alto. Vou me concentrar nisso, juntarei dinheiro, trabalharei como uma louca e no próximo verão, 'Paris, ai vou eu."
      Segundo os estudos viajar faz bem, abre a alma. Pois bem, expandirei a minha alma tão longe que não haverá mais espaço para tanto sentimento de solidão. Abraçarei o corpo e a vida com o inesperado, farei acontecer. Porque uma coisa dessa vida a gente tem que levar, recordações. E eu quero me recordar de coisas que valham a pena, coisas que eu fiz acontecer, que eu busquei.
       Abri meus braços tão largamente e me inclinei para alçar voo. E agora eu vou.
     




   Annabel Laurino



terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Bang Bang


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   Queria lembrar do dia em que a chuva caia fria e molhava os meus cabelos
   E eu sem medo, caminhava pra te encontrar
   Queria te falar o que ficou para ser dito
   Mas eu não pude
   Naquela sexta feira 15 (por que não?)
   Eu queria ter dito que eu fui mais rápido que o tempo
   Que eu vi dois sóis beijarem as estrelas
   E no espaço-tempo eu nos reencontrei
   Roubei uma foto sua e colei cravada no meu espelho
   No tempo presente, agora, eu não te esquecerei
   Mas já passou, já foi 
   O relógio da cozinha só me diz que ainda é cedo
   A musica do Renato me diz que ainda é cedo
   Mas eu só enxergo desespero no quão cedo é
   Para te encontrar, tomar um café
   Despir teu corpo quente das tuas roupas desnecessárias
   beijar tua nuca, te fazer um cafuné
   Dizer assim, calado, que o tempo é rápido
   Mas que eu sou mais, já que eu te roubei pra mim
   Que te colei assim, cravado no meu espelho
   Tua pele em mim
   Eu disse assim
   Meu bem, 
   Te gravei em mim






Annabel Laurino
 
 

Contra e diz

    Para. Senta. Respira. Pensa. Bebe o café. 'Não'. Agora abaixa a caneca. Pensa. Suspira. O pensamento é como uma bola de pingue-pongue, bate e volta. Quando volta, é um baque. Fundo. Então levanta a caneca, bebe o café. Nega. Até o fim. O pensamento é coisa dura de se aceitar. Por isso ele bate. E depois volta. E por isso para e bebe o café.
    E eu penso comigo mesma, 'o que está havendo? Eu nem se quer tenho 20". E esse é o problema, eu nem ao menos tenho 20. E eu só quero envelhecer.
    Para que?, eu me pergunto.
    Para viver mais, eu respondo.
    Então eu sou uma contradição gritante entre duas coisas sem sentido. Eu quero o velho mas ao mesmo tempo sou desesperada pelo novo. Eu sinto saudades, mas mantenho distância. Eu o amo, mas eu o traio. Eu gosto dele, mas eu não o quero para mim. Eu amo azul, mas eu visto vermelho. Eu amo chuva, mas abro o guarda-chuva toda vez que um pingo ameaça cair sobre mim, sobre minha cabeça. Eu não quero gritar mais, mas lá estou eu, berrando à plenos pulmões. Eu não quero amar, mas me entrego em qualquer flor que dê sinais de florescer.
    Assim é a vida e assim eu vou seguindo um caminho que se mostra limpo, mas eu o complico na primeira oportunidade.
    Você já viu aquele filme, "Desconstruindo Harry"? Bem, como uma woodalista eu não poderia citar outro filme, mas a verdade é que eu me sinto constantemente como o próprio Harry. Confusa, perdida, me desconstruindo mentalmente numa capacidade mil de me desencontrar no instante em que me procuro.
    É como procurar a tarraxa de um brinco num quarto completamente limpo, você tem certeza de tê-la deixado cair por ali, no meio do quarto, mas não se encontra lá, não está. E você vasculha cada metro quadrado do lugar, cada metro quadrado limpo e intacto. E nada. Quando por volta e meia, em meio a desistência, meia hora depois, lá está, a tarraxa do seu brinco no quarto.
    Ou as coisas estão onde deveriam estar e eu não as percebo, ou estou vendo ao contrário o que deveria estar vendo certo. E faço isso porque o quero fazer. Porque é mais atraente.
    De repente me vêem à mente de que sou o tipo de pessoa que se agrada muitíssimo de algo errado, algo torto, algo fora do lugar. É como aquela musica, "eu gosto é do estrago".
    Me disseram certa vez que eu nasci ao contrário. Eu respondi, é o signo, escorpião sabe, tudo louco. E as vezes é verdade, pode ser verdade. Mas pode ser bobagem, vai saber.
    Eu vejo as pessoas e eu queria conhecer cada coisa delas, então eu finjo que as conheço, é tão puro - as pessoas e não o fato de conhecê-las - porque conhecê-las de verdade da uma certa preguiça exagerada, já é difícil eu mesma me conhecer.
    Porque eu me desconheço todos os dias, eu nem sei que cor meu cabelo é. Ruivo, castanho, loiro, sei lá. Eu nem sei que cor os meus olhos são. Mel, chocolate, castanho, sei lá. Eu só sei dizer que de uma maneira muito estranha, muito gritante e muito contraditória 'eu sou', eu sou eu mesma, de uma maneira que extravasa qualquer explicação, porque essa coisa de se autodefinir é meio blá, então eu prossigo sendo eu. Eu, essa coisa 'eu'. 
    De repente é profundamente lamentável que apenas duas letras juntas possam definir todo um ser, toda uma massa em movimento a cada segundo que se passa. 




Annabel Laurino
   
   

sábado, 22 de fevereiro de 2014

Moon





Olha rapaz
Eu já nem sei
Se já não é tarde demais
Tão devagar
Que eu nem notei
Mas de repente estranho a minha falta de ar

Olho para rua e
Vejo a chuva cair
Dessa vez espero escurecer
Eu sei que algo está pra me acontecer

It might be soon, my heart changes with the moon

Eu pensei
Que era capaz
De te inventar e não voltar atrás
Mas tanto faz
Quem vai dizer
Que já não era diferente 10 minutos atrás

Sem pressa fico por aqui
Fecho os olhos pra me decidir
Qualquer coisa vai me acontecer
Algo muda perto de você

It might be soon, my heart changes with the moon






Thiago Pethit

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Confabulando com copos de isopor cheios de café sobre um livro com nome de árvore

- Ta, mas como ela morre?
- Ela se mata, sabe. Suicídio. Se joga na frente de um trem, no metro.
- Ela era depressiva?
- Sei lá, mas não acho que para uma pessoa querer se matar tenha que ser obrigatoriamente alguém depressivo.
- Não?
- Não. Ela poderia simplesmente pensar que já tinha feito de tudo e que escolher a sua hora de ir dessa para uma melhor era algo que ela tinha o direito de fazer. Vai ver ela não acreditava em nada.
- E nem no amor. Como podia amar ele então?
- Ela não amava..
- Não?
- Não, ela foi embora.
- Mas só porque ela foi embora não quer dizer que não amasse ele...
- Então ela não aguentou a barra.
- Do amor ou da vida?
- Dos dois.


Annabel Laurino

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

RoadHouse Blues

Let it roll, baby, roll
let it roll, baby, roll
let it roll, baby, roll
let it roll, all night long


The Doors

Barulhinho

   Da página que vira
   Na mão o livro
   A página se enrosca
   Na outra página 
   Faz aquele barulhinho 
   Quase inaudível
   Flap
   Nova página
   Continua a leitura
   E o barulhinho também
   Ainda não acabou o livro





Annabel Laurino
 

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Eu não sei como dizer que eu fui sem querer ter ido

    Talvez se tivesse pintado qualquer chance de ter jogado as malas carregadas no chão e ter desistido da ideia, a ideia essa de ter ido embora, então eu teria voltado ao ponto onde tudo começou, o instante entre o meio de partida e o da decisão, aquele em que simplesmente fui embora.
    Teria voltado no segundo em que arrumo as malas, e as teria deixado vazias. Para voltar vez em quando com uma desculpa amena de pegar algo que esqueci. E esse esquecimento seria o tudo, que eu deixei para trás. 
    Teria voltado no instante em que disse mil palavras por nanosegundos e ao mesmo tempo eu não disse nada, porque na verdade eu nada conseguia dizer, eu nem se quer conseguia pensar. Eu não teria dito nada. Eu voltaria para dizer depois. Como desculpa de que teria pensado melhor, você sabe.
    Não teria respirado tão rápido assim. Teria enchido mais lentamente os pulmões de todo o ar que os pobres coitados poderiam suportar, preenchido as narinas lentamente com todo aquele cheiro de lar incrustado agora só na minha memória. Só na minha mente lenta e profundamente, eu digo, guardei seu cheiro de lar.
    É, talvez do material eu não sinta tanta falta, das fotos talvez. Porque essas eu rasguei todas, pus fogo, chorando convulsivamente como louco, como uma pessoa faz quando não há ninguém por perto assistindo o drama, como uma pessoa costuma fazer quando perde o controle, sem pose e nem classe, como a dor deve ser. De todas as coisas eu só sinto falta da minha gaveta do banheiro com a presença de uma escova de dentes a mais, fora isso somente as fotos, aquelas em preto e branco, principalmente. Na praia, sol de domingo, você de roupa de banho e eu pensando na sua silhueta com os olhos no seu rosto, tentando disfarçar. 
    Nada mais além disso mesmo. 
    Se me perguntassem hoje se eu não teria ido embora, caso tivesse a oportunidade de voltar no tempo, eu teria dito que teria ido do mesmo jeito. Uma hora ou outra um de nós teria pulado do barco. Não é assim que funciona? Pelo menos 5% dos relacionamentos nascem para serem massacrados por uma história triste onde sempre existe alguém que 'não sabe lidar'. O nosso foi assim. Fomos os 5% dos casais mais infelizes do mundo, aqueles que foram feitos para não ficarem juntos. Algo entre o seu cérebro e o meu, algo além da minha boca e da sua, alguma conexão falhou. Hoje eu entendo, antes não. Por isso eu convivo bem com o fato de ter ido embora e ponto. Não mudaria isso. Mudaria ter sido assim, tão abrupto. Esmigalhando qualquer chance de reparação.
    Nada foi covarde. Foi só que eu 'não pude lidar'. Você sabe. Não ouço mais Harrison por culpa sua, não toquei mais na minha guitarra desde então. 
    Droga, eu só queria pelo menos ter uma desculpa para bater na sua porta num dia desses, dizendo que esqueci minha camisa favorita, meu CD, meu livro, a foto da minha mãe, qualquer coisa. 
    E dizer olá outra vez.
    Como se eu nunca tivesse ido embora. 






Annabel Laurino

sábado, 8 de fevereiro de 2014

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“Hoje acordei sem chão, e percebi que nunca tive casa. Não uma moradia, e sim um sustento. Já tive base, mas nunca tive proteção. O que é engraçado, pois tenho milhões de motivos para sorrir, mas uma simples telha fora do lugar consegue fazer com que uma tempestade me molhe por inteiro, se é que me entende. Pequenas coisas fora do lugar fazem estragos enormes em mim, e eu não me acostumo com isso.”



 Gabriel Malaquias

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

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    Quando você pensa que tudo está perdido, não está. Meu bem, a vida não é só isso que os olhos podem alcançar. Eu sei, eu sei. Agora nesse meu momento de felicidade gritante essas palavras parecem meio blá, meio chiclete, coisa que você já ouviu tantas e tantas outras vezes. Mas eu não te minto, porque a luz de dentro é maior, é maior que muita coisa ruim que possa parecer gigante, invencível.
     Quando menos se espera os dias se renovam com céu limpo e claro e o que menos se espera, acontece. 
     Acredite, você tem que acreditar.



Annabel Laurino