quarta-feira, 5 de outubro de 2016

Vamos casar!


            Não vai ser no domingo. Vai ser numa terça-feira 13. Não vou me vestir de branco, não vai ter véu e grinalda. Mas serei a tua noiva ainda assim. Tu não vai ter que esperar por mim, porque chegaremos juntos, de mãos dadas. É assim que tem sido até aqui, não é?
            Vamos ter um lugar chamado nosso. E eu sei, tu vai comprar jornal pra mim. Vamos ouvir nossas músicas, cozinhar comidas gostosas no nosso fogão pequeno e mudar os móveis de lugar milhares de vezes. Aos domingos, vamos acordar tarde, eu vou passar o café, vamos ver filmes e você vai dormir antes de terminar. A gente vai brigar. Mas depois tudo vai ficar bem de novo.
            Não sei como chegamos até aqui. Eu olho uma foto nossa em frente aquela cafeteria em Pelotas. Nós nos olhando enquanto alguém tirava a foto. Eu amo aquela foto. Naquele segundo em que te olhava eu pensava “Eu amo esse cara”.
            Eu sempre amei a tua sensibilidade. O fato de tu me entender, de forma tão sensível e carinhosa. Eu amo tua maneira de falar comigo, o fato de tu ser meu melhor amigo, meu companheiro, meu conselheiro. E tudo bem que nem sempre tu dê os melhores conselhos do mundo. A gente ri, juntos, não é mesmo? A gente ri um do outro. Eu amo isso.
            Mas e aquela foto, eu tava falando dela. Foi no dia em que a gente colocou nossa aliança. Estávamos tão felizes. Achamos que o casamento ia ser algo distante, “ia levar tempo”, tu disse muitas vezes, desanimado, demonstrando ansiedade pra que o dia chegasse logo. Choramos muitas vezes antes de chegar até aqui. Choramos juntos, abraçados, choramos emburrados um com outro. Choramos desesperados. A única certeza: queríamos nos casar.
            E agora o dia está chegando. Sei que mesmo assim, sentirei saudades de ti todos os dias. Assim como sinto agora. Sei que vou querer sempre afundar a minha mão no teu cabelo e tocar tua cabeça com a ponta dos meus dedos, encontrar a pinta no teu queixo enquanto passo a mão pelo teu rosto. Beijar teu nariz, cheirar teu nariz. Beijar teu olho. Ler um poema em voz alta enquanto tu senta do meu lado com uma caneca de café.
            Naquele dia eu não sabia que isso tudo realmente podia acontecer. Nem mesmo quando tudo começou. Com um café. Um café num copo de isopor tomado as pressas numa rua movimentada de estudantes. Você de cabelo cacheado e grande, eu com a minha camiseta dos Guns N' Roses. Depois disso foi uma série de músicas compartilhadas, conversas sobre livros e um filme que mudou o rumo de tudo depois. Eu ainda acho que ele foi o grande influenciador. Será que...?
            Ah, eu mal posso esperar pra fungar teu pescoço assim que acordarmos. Mal posso esperar pelos próximos choros que ainda virão. Pelos sorrisos, pelas comemorações, pelos dias de tristeza, - porque agora já sabemos que nem tudo é flores, e que esses dias chegam sim -, pelos dias de sol batendo gostoso na nossa cara de preguiça. Mal posso esperar pelas nossas viagens, pelos dias de chuva em que não faremos nada. E pelos dias de chuva em que eu acabarei te arrastando pra fora de casa, pra pular poças, pegar um ônibus, ir pra algum lugar. E eu direi assim “vamos pr’algum lugar”. Tu vai rir. Vai ficar tudo bem. Você vai me deixar ser a sua Holly. Vai aturar minhas tpm's mais cruéis e eu sei, no final do dia, você vai me encher de margaridas e amores. 
            E vai acontecer mesmo, não é? Vamos casar. Vamos casar! Chamem os vizinhos, avisem o tio da carrocinha de churros, o cara que vende jornal, a professora que deu aula pra gente na primeira série e que a gente nem sabia, mas na verdade estudamos juntos todo o fundamental. Avisem os primos distantes, os tios, as tias, a família toda. Vamos comemorar com todo mundo. Amanhã mesmo eu vou contar pro motorista do ônibus. Vou ligar pra uma amiga que não vejo a meses. Vou contar baixinho no ouvido dos meus cachorros. Vou falar pra mim mesma, na frente do espelho, enquanto penteio o cabelo ou meço meu nariz mais uma vez, assim, bem baixinho “eu vou casar.”.
            Lembro do vô, lembro da vó. Que a gente chegue as bodas de ouro como eles chegaram. Que a gente tenha tanta paciência como eles tiveram, que a gente persista até o fim como eles persistiram, que a gente lute mesmo na dor. Que a gente nunca esqueça que a nossa amizade vem em primeiro lugar, que na verdade, antes disso tudo, a primeira coisa que a gente se chamou foi de amigo.
É, meu amigo, a gente vai casar! A gente vai casar, mas não vai ser no domingo. E esse escrito é sobre nós. É real. É real.
Beijos com gosto de menta com chocolate, 


Annabel Laurino