O sol incidia por trás das copas das árvores. Árvores gigantescas que acomodam ninhos de pássaros como casinhas estranhas. Troncos escuros cheios de musgo. As folhas lá do alto, verdes, tão verdes e vivas quanto o verão, brilham, ah brilham, pela camada solar que acoberta os altos.
Permaneço deitada na grama, vejo meu peito subir e descer ao longo da respiração. Lenta. Como o vento que sobra deliciosamente no meu corpo, nos meus braços e pernas nus, no meu rosto. Refrescando o calor do ar abafado que aumenta cada vez mais pela influência do lindo sol acima. Eu ouço o cântico feliz dos pássaros, ouço as vozes por baixo da música que toca nos meus ouvidos no ultimo volume do aparelho de som dos fones, ouço pessoas rirem, gargalharem e contarem uma história, ouço riso de crianças, latidos de cães.
Lá no fundo de tudo que vejo, ainda olhando pra cima, pra copa das árvores, pras folhas, pro ar, eu vejo o céu. Azul cheio de nuvens brancas tão brancas que unidas formam cinza. Lembro de algodão. Sem gosto.
O vento balança os meus cabelos levantando-os gentilmente do chão e me dando uma deliciosa sensação de frescor.
Novamente eu fito as folhas, elas dançam uma sincronia perfeita de uma dança divina, direita e esquerda, depois se balançam rodopiando no ar, unindo-se umas as outras na ajuda dos finos galhos que se balançam pelo vento. E novamente repetem e repetem a sincronia, parecem bailarinas, pomposas e delicadas, despencando as mais frágeis, as mais secas e finas do grupo, caindo pro chão, sendo pisoteadas. Que fim trágico.
Eu as invejo por um instante. Tão delicadas, tão divinas, que me lembram como viver, seguindo o ritmo do vento, rápido, passos velozes e violentos, lento, delicado, pomposo, sem pressa, sem dor.
Tudo, tudo adentrando a cúpula das minhas idéias mais sórdidas e pequenas, como uma noz. Fecho os olhos, a música nos meus ouvidos é tão alta que agora abafa os sons de fundo. O vento ainda prende-se no meu rosto.
Que desperdício. Que desperdício.
Minha mão posta sobre meu corpo formiga, e formiga. O vento me abraça tênue e gentil. Como um abraço que muito não ganho mais.
Sinto o cheiro de terra, fresca, quente, coberta de folhas secas e amarelada.
E em um segundo qualquer, disperso quanto à luz, minha anotação mental, minha distração eu diria, sobre tudo que eu vejo, somem como quando se apaga a luz. Sem explicação.
A nostalgia me assombra.
Eu vejo o sol por trás das lentes escuras dos óculos e pergunto-me, quem sentiria medo na luz? Medo da solidão?
Medo da saudade.
Então eu me pergunto. Onde está você? Onde?
Você está no vento, o que eu respiro, o que me abraça, o que sacode o mundo, o sol, que aquece, as folhas, as frágeis, as cúmplices. Você é a parte do mundo, o que eu fotografo, lento tão lento.
Minha mão formiga, desejando seu toque. Tocar você. Sua pele. Sentir seu cheiro. Sentir seu gosto. Ver seu rosto.
Onde está você? Aqui, eu penso, - agora, neste lugar, aqui comigo - ah que desperdício, você não está.
E os anjos choram.
Annabel Laurino.