quinta-feira, 29 de maio de 2014

Fora do Ar

   Tem alguém ai? Alguém ainda vem me visitar? Alguém lê essas palavras tortas e enviesadas? 
   Eu não consigo ouvir respostas, como se estivesse em algum segundo plano, distante de tudo. E o mundo se silencia. Não ouço mais ninguém, nem sei se me ouvem. 
   George Harrison é meu melhor amigo nessa noite. Coloco 'While My Guitar Gently Weeps' para repetir pela décima vez e choro. E choro e choro. Os olhos ardem no começo, em relutância para não se darem por vencidos, mais ai depois eu me entrego. E choro e choro. Agora é fácil.
     Não há vergonha em chorar. Fico feliz que eu ainda sinta algo para poder chorar. 
     Se uma cor pudesse me definir no atual momento seria cinza. Foram tantos dias estáticos. Quanto tempo faz e eu não me dei de conta? Quanto tempo faz que a estação ficou com ruídos e eu nem notei? 
     Escrever agora dói, dói e eu choro. Qualquer esforço em falar, em escrever a respeito incomoda. Como uma coisa estranha, fora do lugar, que você sabe que estava o tempo inteiro ali, mas você só percebeu realmente o incomodo que ela trazia agora. Eu não sou alguém depressivo, nada de grave me aconteceu, só para explicar. Particularmente desconfio que sou apenas uma pessoa que sente de mais. Sentimental de mais. 
     Estou cansada do mundo.
     Se eu pensar de mais eu fico enjoada, enojada, cansada. Então eu parei de pensar, eu parei de escrever. Chega um momento que você cansa de lutar, que você cansa de dar braçadas contra a maré, que a musica do Cazuza não faz mais sentido. "Andar contra a corrente só para exercitar", sério? 
    Se antes eu me dava ao trabalho, nesses dias estáticos eu simplesmente me calei. Meu espirito anarquista sucumbiu no ar como um balão furado. Já era, a festa acabou. O que está havendo comigo? Alguém quer realmente saber? Nem mesmo eu sei se eu quero. 
     Sinto como se estivesse cometendo vários erros, erros e erros. Mas alguém me explica o que é errado afinal? 
     Eu nunca entendi essa porra. Não, espera, eu não posso falar porra. Porra. 
     Acordo todos os dias pensando se o dia vai me aceitar. Bem, vamos ver, será que hoje vai ser um dia bom? E novamente é um dia cinza. Nada de emocionante acontece, eu olho ao redor e parece que todas as pessoas estão o tempo inteiro interpretando suas vidas, como se não vivessem de verdade aquilo que mostram ser, aquilo que aparentam saber. E por que?
    George escreveu "eu olho para o chão e vejo que ele precisa ser limpo". Eu também vejo a mesma coisa. Tudo parece errado então. 
    Eu faço o que eu faço por que eu gosto ou por que eu fui induzida a gostar? O que eu sou quando não há ninguém para quem eu precise mostrar o que eu sou? Quem eu sou?
    Tudo estático. 
    Silêncio.
    Vozes abafadas ao fundo e que não chegam até mim. Com olhos já inchados eu choro mais um pouco. Tenho vontade de ir para Bali, Cucuias, Polo Norte, Triângulo das Bermudas, qualquer coisa. Qualquer lugar.
    Mesmo sabendo que a pergunta ainda assim perduraria no ar. 
    Sem resposta. Sem resposta. 
    Sem frequência. 




Annabel Laurino