Chico Buarque
sexta-feira, 29 de novembro de 2013
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“Já passou, já passou. Se você quer saber, eu já sarei, já curou. Me pegou de mal jeito mas não foi nada, estancou.”
quarta-feira, 27 de novembro de 2013
Mr. Woody
Na ultima terça feira eu tive certeza, devo mesmo estar enlouquecendo. Melhor dizendo, eu tive um sonho esquisito na noite passada. Bem, daqueles em que quando acordamos só o que nos resta é desconfiar da tamanha loucura guardada em nossa mente por ter recriado um imaginário tão extenso para um sonho tão sem lógica.
De forma alguma que eu não tenha me agradado muitíssimo do tal sonho. É só que, bem, quantas vezes na minha vida o próprio Woody Allen em pessoa poderia estar presente na minha sala de estar tomando uma xícara de café comigo enquanto me aconselhava calmamente a respeito de Freud? Desde a ultima vez que eu chequei, nenhuma, é claro.
Mas é isso mesmo, Woody Allen, o próprio resolveu surgir nos meus sonhos recriado de uma forma completamente característica e real de como sempre imaginei. Descabelado, com pequenos tufos de cabelos mal espalhados sobre uma futura careca em vista, óculos de grau altíssimo com armações escuras, baixinho, nariz grande, suéter bege e calças cáqui claras, desengonçado, frenético, um humor irônico transbordante.
O sonho começa assim, alguém bate na porta, mas eu não escuto porque estou ocupada em tentar desentortar livros amassados que estão espalhados por toda a casa, não sei por qual motivo os livros estão tortos e tão amassados, mas volta e meia eu tento arrumá-los, página por página, então apertam a campainha, que é uma imitação bem fiel de Jingle Bells Rock numa versão anos 30. Dessa vez eu me separo dos livros e vou até a porta, mas a chaleira começa a ferver e eu volto e a tiro do fogo servindo uma xícara cheia de café até que resolvo preparar mais uma xícara, então, ao som da campainha novamente tocando, eu me encaminho até a porta e a abro.
Sim, ele mesmo, o tal, o senhor Woody em pessoa me sorri do batente da porta com seu sorriso irônico e pergunta "Fez o café?", eu não digo nada, meneio a cabeça em afirmação e o deixo entrar, da minha altura, magricela, uma maneira de andar como se a sua forma frenética estivesse em conflito com suas pernas bamboleando.
Woody se senta e toma em mãos sua xícara de café que eu nem tive tempo de oferecer, pega o jornal e começa a lê-lo, por um longo tempo, até que salta do sofá deixando o jornal cair e diz "Sabe aquela galeria de arte nova de que te falei? Então, é hoje, inaugurou!". Sem perder tempo ele pega da minha mão e me arrasta porta a fora. Juntos, nós andamos por ruas de calçadas sujas, passamos por cães de raças em coleiras coloridas, guimbas de cigarros e árvores de folhas alaranjadas e desbotadas, outono, eu penso.
Woody Allen acende um cigarro e como se recriando a cena de Manhattan, porém desta vez numa rua de um sol fraco ao fundo e dentro do meu próprio sonho, ele diz:
- Sei que não deveria estar fumando isso, dá câncer. Mas eu fico tão sexy com ele nas mãos, não acha?
- Sim, sim. De toda forma. - respondo. E ele sorri, contente pela minha resposta.
- "Sabe Nova York era sua cidade, e será para sempre." - ele recita olhando-me por trás de suas lentes de fundo de garrafa.
- Amo esta parte, amo este filme. É a minha frase, esta que acabou de dizer.
- Não, é a nossa frase, menina.
Caminhamos e caminhamos enquanto dividimos cigarros e vemos esquilos no Central Park. Tudo que se passa depois são flashes esquisitos. De repente estamos numa galeria toda branca e enevoada, com sofás/pufts dispostos no meio onde as pessoas se deitam e conversam e riem de qualquer coisa, mas obras de arte em exposição não há alguma. Logo, estou deitada nas pernas do senhor Woody Allen, no tal puf gigante, ouvindo-o me dizer que tudo nessa vida é natural "Natural, natural' ele repete, como se estivesse me apresentando a tal palavra pela primeira vez. E por fim, ele diz "Sabe, bem, eu nunca faria parte de um clube do qual aceitassem pessoas como eu. E sabe por que? Porque prefiro fazer parte de um lugar do qual não posso ser aceito. Quem não, não é mesmo?"
E o sonho termina com a imagem de eu e o senhor Woody rindo enlouquecidamente sobre os pufs gigantes de uma galeria cheia de pessoas e ao que parece, numa rua qualquer da Times Square.
Acordei com a sensação esquisita de que mesmo ludibriada pelo sonho eu queria que fosse verdade. Ah sim, claro que queria. Quem não?
E embora sabendo que nada se passou de um sonho, desejei secretamente que uma réstia dele fosse uma lembrança de algo verdadeiro. E assim, Manhattan me veio à mente, e num impulso sedento por algo palpável, eu revivo o filme por mais um milhão de vezes, incontavelmente.
De forma alguma que eu não tenha me agradado muitíssimo do tal sonho. É só que, bem, quantas vezes na minha vida o próprio Woody Allen em pessoa poderia estar presente na minha sala de estar tomando uma xícara de café comigo enquanto me aconselhava calmamente a respeito de Freud? Desde a ultima vez que eu chequei, nenhuma, é claro.
Mas é isso mesmo, Woody Allen, o próprio resolveu surgir nos meus sonhos recriado de uma forma completamente característica e real de como sempre imaginei. Descabelado, com pequenos tufos de cabelos mal espalhados sobre uma futura careca em vista, óculos de grau altíssimo com armações escuras, baixinho, nariz grande, suéter bege e calças cáqui claras, desengonçado, frenético, um humor irônico transbordante.
O sonho começa assim, alguém bate na porta, mas eu não escuto porque estou ocupada em tentar desentortar livros amassados que estão espalhados por toda a casa, não sei por qual motivo os livros estão tortos e tão amassados, mas volta e meia eu tento arrumá-los, página por página, então apertam a campainha, que é uma imitação bem fiel de Jingle Bells Rock numa versão anos 30. Dessa vez eu me separo dos livros e vou até a porta, mas a chaleira começa a ferver e eu volto e a tiro do fogo servindo uma xícara cheia de café até que resolvo preparar mais uma xícara, então, ao som da campainha novamente tocando, eu me encaminho até a porta e a abro.
Sim, ele mesmo, o tal, o senhor Woody em pessoa me sorri do batente da porta com seu sorriso irônico e pergunta "Fez o café?", eu não digo nada, meneio a cabeça em afirmação e o deixo entrar, da minha altura, magricela, uma maneira de andar como se a sua forma frenética estivesse em conflito com suas pernas bamboleando.
Woody se senta e toma em mãos sua xícara de café que eu nem tive tempo de oferecer, pega o jornal e começa a lê-lo, por um longo tempo, até que salta do sofá deixando o jornal cair e diz "Sabe aquela galeria de arte nova de que te falei? Então, é hoje, inaugurou!". Sem perder tempo ele pega da minha mão e me arrasta porta a fora. Juntos, nós andamos por ruas de calçadas sujas, passamos por cães de raças em coleiras coloridas, guimbas de cigarros e árvores de folhas alaranjadas e desbotadas, outono, eu penso.
Woody Allen acende um cigarro e como se recriando a cena de Manhattan, porém desta vez numa rua de um sol fraco ao fundo e dentro do meu próprio sonho, ele diz:
- Sei que não deveria estar fumando isso, dá câncer. Mas eu fico tão sexy com ele nas mãos, não acha?
- Sim, sim. De toda forma. - respondo. E ele sorri, contente pela minha resposta.
- "Sabe Nova York era sua cidade, e será para sempre." - ele recita olhando-me por trás de suas lentes de fundo de garrafa.
- Amo esta parte, amo este filme. É a minha frase, esta que acabou de dizer.
- Não, é a nossa frase, menina.
Caminhamos e caminhamos enquanto dividimos cigarros e vemos esquilos no Central Park. Tudo que se passa depois são flashes esquisitos. De repente estamos numa galeria toda branca e enevoada, com sofás/pufts dispostos no meio onde as pessoas se deitam e conversam e riem de qualquer coisa, mas obras de arte em exposição não há alguma. Logo, estou deitada nas pernas do senhor Woody Allen, no tal puf gigante, ouvindo-o me dizer que tudo nessa vida é natural "Natural, natural' ele repete, como se estivesse me apresentando a tal palavra pela primeira vez. E por fim, ele diz "Sabe, bem, eu nunca faria parte de um clube do qual aceitassem pessoas como eu. E sabe por que? Porque prefiro fazer parte de um lugar do qual não posso ser aceito. Quem não, não é mesmo?"
E o sonho termina com a imagem de eu e o senhor Woody rindo enlouquecidamente sobre os pufs gigantes de uma galeria cheia de pessoas e ao que parece, numa rua qualquer da Times Square.
Acordei com a sensação esquisita de que mesmo ludibriada pelo sonho eu queria que fosse verdade. Ah sim, claro que queria. Quem não?
E embora sabendo que nada se passou de um sonho, desejei secretamente que uma réstia dele fosse uma lembrança de algo verdadeiro. E assim, Manhattan me veio à mente, e num impulso sedento por algo palpável, eu revivo o filme por mais um milhão de vezes, incontavelmente.
Annabel Laurino
sábado, 23 de novembro de 2013
Marina
Sua boca tinha a cor de um m&m's cor de rosa. Seus olhos, de um marrom escuro, quase negro. Ela fitou ao longe e permaneceu ressentida na sua própria forma de pensar. A cor do mar era de um cinza sujo, quase que um marrom desbotado, coisa esquisita mesmo. Hoje os peixeiros não estavam em seus postos, cortando os peixes e falando coisas avulsas e sem nexo. Hoje o dia era vazio.
Marina ficou aqui, encostada na base de um lampião todo pichado e sujo enquanto analisava o outro lado do porto. Acendeu seu cigarro, calma e lentamente e depois vislumbrou um homem alto vir em sua direção. "Me empresta o fogo ai, moça?". Claro que não iria dizer para ele que não tinha como lhe emprestar fogo algum, mas contendo as palavras lhe entregou na mão enorme e cheia de calos seu isqueiro, esperando ele acender seu cigarro e lhe devolver, e o homem se foi.
O vento subia e descia lentamente sobre o mar e fazia cócegas no seu rosto, dançava com os seus cabelos, encarapitando-o para todas as direções, prendeu algumas poucas mechas, as que podia, atrás das orelhas e continuou ali, encostada, como se não tivesse nada para fazer, como se por algum motivo do acaso tivesse caído exatamente ali, naquela posição, naquele minuto e horário do dia. Vinda de lugar nenhum.
Se fechasse seus olhos e os abrisse novamente poderia ver a cena de ontem como se não fosse a protagonista da própria e sim uma telespectadora. Marina e ele sentados lá naquele banquinho cor de creme, do outro lado do porto, sua bolsa entre os dois. Perto por centímetros, separados por quilômetros invisíveis e ao mesmo tempo tão visíveis aos seus próprios olhos. Separados para sempre pensou.
Sabia exatamente o que o tempo havia feito com eles, pois ele havia os separado, uma distância absurda um do outro, como uma crosta se abrindo sobre a terra em bilhares de rachaduras e vincos, assim tinha sido, até que de repente ficou-se um abismo, irrefutável, irreparável. Irremediável.
Sentiu saudade, sua mente vagava exatamente como a visão de um telespectador ali, a observar tudo. Podia vislumbrar os dois, a ela mesma e a ele, sentados. A diferença abrupta de tamanho dos corpos um do outro, ele tão imenso, ela tão pequena. Podia vislumbrar ele acendendo o seu cigarro e a fumaça sucumbindo no ar, o cão vadio passando atrás deles, ela mesma secando o rosto e encurvando os ombros como se sentisse frágil, como se tentasse sumir dentro de si mesma e se auto desligar, sumir dali.
O tempo é ladrão. Ele rouba a nossa juventude, nossas lembranças, ele assalta os momentos mais genuínos e se você tiver sorte, talvez ele esqueça de vasculhar embaixo da sua cama ou por dentro da sua gaveta alguma coisa que você deixou escondida, na esperança de pelo menos aquilo não pudesse ser tirado de si, talvez você tenha sorte se ele não quiser levar tudo consigo, seus bibelôs e quadros na parede, seus livros e seus beijos roubados.
Sentia-se profundamente amargurada e a maresia trouxe um gosto amargo à sua boca cor de rosa, agora já meio desbotada. Quis ter algum poder sobrenatural, como nos filmes ou nos livros, quis salvar alguma coisa que não podia ser salva, como aquela cena agora já fundida na sua memória. Teria a escrito novamente e mudado o seu rumo para todo o sempre. Teria dramatizado eloquentemente em alguns pontos e posto ali um final digno, uma coisa bonita e rara, e por que não feliz?
Mas agora o tempo já havia entrado e roubado seus últimos restos de coisas guardadas, escondidas. E ele já havia partido, como sempre, rápido. Marina era assim, maresia a solta, saudade branda, cheia de amores não desfrutados e memórias guardadas.
Como se batesse os vãos de uma claquete, ela fechou a cena da memória dentro de sua cabeça e se resignou a só sentir saudade. Apenas isso. Até que o tempo retornasse mais uma vez e lhe roubasse isso.
Se tivesse sorte.
Marina ficou aqui, encostada na base de um lampião todo pichado e sujo enquanto analisava o outro lado do porto. Acendeu seu cigarro, calma e lentamente e depois vislumbrou um homem alto vir em sua direção. "Me empresta o fogo ai, moça?". Claro que não iria dizer para ele que não tinha como lhe emprestar fogo algum, mas contendo as palavras lhe entregou na mão enorme e cheia de calos seu isqueiro, esperando ele acender seu cigarro e lhe devolver, e o homem se foi.
O vento subia e descia lentamente sobre o mar e fazia cócegas no seu rosto, dançava com os seus cabelos, encarapitando-o para todas as direções, prendeu algumas poucas mechas, as que podia, atrás das orelhas e continuou ali, encostada, como se não tivesse nada para fazer, como se por algum motivo do acaso tivesse caído exatamente ali, naquela posição, naquele minuto e horário do dia. Vinda de lugar nenhum.
Se fechasse seus olhos e os abrisse novamente poderia ver a cena de ontem como se não fosse a protagonista da própria e sim uma telespectadora. Marina e ele sentados lá naquele banquinho cor de creme, do outro lado do porto, sua bolsa entre os dois. Perto por centímetros, separados por quilômetros invisíveis e ao mesmo tempo tão visíveis aos seus próprios olhos. Separados para sempre pensou.
Sabia exatamente o que o tempo havia feito com eles, pois ele havia os separado, uma distância absurda um do outro, como uma crosta se abrindo sobre a terra em bilhares de rachaduras e vincos, assim tinha sido, até que de repente ficou-se um abismo, irrefutável, irreparável. Irremediável.
Sentiu saudade, sua mente vagava exatamente como a visão de um telespectador ali, a observar tudo. Podia vislumbrar os dois, a ela mesma e a ele, sentados. A diferença abrupta de tamanho dos corpos um do outro, ele tão imenso, ela tão pequena. Podia vislumbrar ele acendendo o seu cigarro e a fumaça sucumbindo no ar, o cão vadio passando atrás deles, ela mesma secando o rosto e encurvando os ombros como se sentisse frágil, como se tentasse sumir dentro de si mesma e se auto desligar, sumir dali.
O tempo é ladrão. Ele rouba a nossa juventude, nossas lembranças, ele assalta os momentos mais genuínos e se você tiver sorte, talvez ele esqueça de vasculhar embaixo da sua cama ou por dentro da sua gaveta alguma coisa que você deixou escondida, na esperança de pelo menos aquilo não pudesse ser tirado de si, talvez você tenha sorte se ele não quiser levar tudo consigo, seus bibelôs e quadros na parede, seus livros e seus beijos roubados.
Sentia-se profundamente amargurada e a maresia trouxe um gosto amargo à sua boca cor de rosa, agora já meio desbotada. Quis ter algum poder sobrenatural, como nos filmes ou nos livros, quis salvar alguma coisa que não podia ser salva, como aquela cena agora já fundida na sua memória. Teria a escrito novamente e mudado o seu rumo para todo o sempre. Teria dramatizado eloquentemente em alguns pontos e posto ali um final digno, uma coisa bonita e rara, e por que não feliz?
Mas agora o tempo já havia entrado e roubado seus últimos restos de coisas guardadas, escondidas. E ele já havia partido, como sempre, rápido. Marina era assim, maresia a solta, saudade branda, cheia de amores não desfrutados e memórias guardadas.
Como se batesse os vãos de uma claquete, ela fechou a cena da memória dentro de sua cabeça e se resignou a só sentir saudade. Apenas isso. Até que o tempo retornasse mais uma vez e lhe roubasse isso.
Se tivesse sorte.
Annabel Laurino
quinta-feira, 21 de novembro de 2013
A perda da conta dourada
Quinta feira é um dia tão normal da semana. Quinta feira, hoje, começou estranha para mim. Primeiro porque tinha acabado o café. E o dia não pode começar sem café. É tão boring, tão saco, tão triste. Descabelada, de pijama amarrotado, cara amassada, 'merda' pensei, acordar sem café é como ir em aniversário de criança e descobrir que não tem negrinho.
Olhar aquele pote de vidro reaproveitado de picles vazio do meu café de sempre, só com uns últimos flocos negros no fundo, foi broxante no mínimo. Cabral, eu precisava comprar café, sem ele o dia não começa bem, embora já tivesse começado a algumas horas.
Ranzinza, eu me sentia assim. Nostálgica. Até uma folha caindo no meio da construção dos fundos da minha casa pareceu poético, triste, tão desconexo e ao mesmo tempo tão no seu lugar. Algo ficou fervilhando num canto escondido da minha mente, escondido até das minhas percepções mais perspicazes. Dos meus sensores mais rápidos. Algo que deveria mesmo estar escondido, era esse seu lugar, o canto escuro da minha mente, para que nem eu mesma visse, e que talvez, eu mesma o tenha forçado a estar lá.
Calcei os sapatos depois que vesti as calças. Como deve-se fazer. E nos meus sapatos pretos de contas douradas, eu vi. Faltava uma conta.
Pequenina, dourada, minuscula. Ela caiu, ou eu a perdi, sabe-se lá onde, quando, como. Faltava a minha conta dourada no meu sapato preto e o sentimento foi o mesmo de ver o meu vidro de picles sem o café. Respirar fundo e mentalizar coisas boas não iria funcionar, eu já estava avançando de uma etapa ranzinza para um mau humor total.
Para completar, juntamente com me sentir mau humorada eu me senti nostálgica. Filosofa. Ah, lá se foi a minha conta dourada. E da conta dourada, do meu café preto, tudo isso que me faltava eu nem quis mais sair de casa. Perdi a vontade. Ela sucumbiu, saiu correndo para debaixo da cama e se escondeu. Nisso tudo, o que estava lá no fundo obscuro da minha mente resolveu dar as caras e veio dando olá, fazendo barulho, arrastando coisas e tirando outras de lugar enquanto desestabilizava tudo.
A sensação foi mais forte, porque ainda olhando para o meu sapato com aquela estranha falta de uma conta que ligava todas as outras, parecendo até um sorriso sem um dente da frente, foi como me senti quando pensei nele, nele. É. Ele. Ele mais do que a minha conta dourada dando falta ou o café preto sem réstias no fundo do vidro.
O que já era pior se tornou uma catástrofe e o dia seguiu assim, musicas de Frank Sinatra, sem nenhum café para acompanhar e um sol e depois uma chuva dando alivio e um sol dando socos na minha cara novamente, e vento frio e gente me empurrando nas ruas como se não houvesse amanhã. Claro, e o meu sapato com uma conta faltando.
Várias vezes tive vontade de voltar para a cama e dormir e dormir. Porque como já dizia Caio Fernando Abreu, dormir é o melhor remédio, ele remedia alguns problemas. Sendo assim eu queria fazer exatamente isso. Mas também não pude.
O dia acabou.
Comprei mais café para o vidro de picles.
Não encontrei a minha conta dourada do sapato preto, mas substitui por outra, ficou estranha, meio desloucada no meio das outras iguais. Assim é a vida.
Continuei nostálgica.
E ele? Ele é a minha conta dourada perdida numa calçada suja por ai.
Assim é a vida. Conclui.
Olhar aquele pote de vidro reaproveitado de picles vazio do meu café de sempre, só com uns últimos flocos negros no fundo, foi broxante no mínimo. Cabral, eu precisava comprar café, sem ele o dia não começa bem, embora já tivesse começado a algumas horas.
Ranzinza, eu me sentia assim. Nostálgica. Até uma folha caindo no meio da construção dos fundos da minha casa pareceu poético, triste, tão desconexo e ao mesmo tempo tão no seu lugar. Algo ficou fervilhando num canto escondido da minha mente, escondido até das minhas percepções mais perspicazes. Dos meus sensores mais rápidos. Algo que deveria mesmo estar escondido, era esse seu lugar, o canto escuro da minha mente, para que nem eu mesma visse, e que talvez, eu mesma o tenha forçado a estar lá.
Calcei os sapatos depois que vesti as calças. Como deve-se fazer. E nos meus sapatos pretos de contas douradas, eu vi. Faltava uma conta.
Pequenina, dourada, minuscula. Ela caiu, ou eu a perdi, sabe-se lá onde, quando, como. Faltava a minha conta dourada no meu sapato preto e o sentimento foi o mesmo de ver o meu vidro de picles sem o café. Respirar fundo e mentalizar coisas boas não iria funcionar, eu já estava avançando de uma etapa ranzinza para um mau humor total.
Para completar, juntamente com me sentir mau humorada eu me senti nostálgica. Filosofa. Ah, lá se foi a minha conta dourada. E da conta dourada, do meu café preto, tudo isso que me faltava eu nem quis mais sair de casa. Perdi a vontade. Ela sucumbiu, saiu correndo para debaixo da cama e se escondeu. Nisso tudo, o que estava lá no fundo obscuro da minha mente resolveu dar as caras e veio dando olá, fazendo barulho, arrastando coisas e tirando outras de lugar enquanto desestabilizava tudo.
A sensação foi mais forte, porque ainda olhando para o meu sapato com aquela estranha falta de uma conta que ligava todas as outras, parecendo até um sorriso sem um dente da frente, foi como me senti quando pensei nele, nele. É. Ele. Ele mais do que a minha conta dourada dando falta ou o café preto sem réstias no fundo do vidro.
O que já era pior se tornou uma catástrofe e o dia seguiu assim, musicas de Frank Sinatra, sem nenhum café para acompanhar e um sol e depois uma chuva dando alivio e um sol dando socos na minha cara novamente, e vento frio e gente me empurrando nas ruas como se não houvesse amanhã. Claro, e o meu sapato com uma conta faltando.
Várias vezes tive vontade de voltar para a cama e dormir e dormir. Porque como já dizia Caio Fernando Abreu, dormir é o melhor remédio, ele remedia alguns problemas. Sendo assim eu queria fazer exatamente isso. Mas também não pude.
O dia acabou.
Comprei mais café para o vidro de picles.
Não encontrei a minha conta dourada do sapato preto, mas substitui por outra, ficou estranha, meio desloucada no meio das outras iguais. Assim é a vida.
Continuei nostálgica.
E ele? Ele é a minha conta dourada perdida numa calçada suja por ai.
Assim é a vida. Conclui.
Annabel Laurino
terça-feira, 19 de novembro de 2013
segunda-feira, 18 de novembro de 2013
The Lady is a Tramp
"She likes the free, fresh wind in her hair
Life without care
She's broke, and it's 'ok'"
Frank Sinatra
Rocket Queen
Eu vejo você parada
Parada sozinha
É um lugar solitário para você
Para você estar
Se você precisar de um ombro
Ou se você precisar de um amigo
Eu estarei aqui esperando
Até a amargura passar
Ninguém precisa da tristeza
Ninguém precisa da dor
Eu odeio ver você
Andando aí fora
Aí fora na chuva
Então não me castigue
Ou pense que eu, eu te ofendi
Como aqueles que te levam
E te fazem sofrer
Muito longe
Parada sozinha
É um lugar solitário para você
Para você estar
Se você precisar de um ombro
Ou se você precisar de um amigo
Eu estarei aqui esperando
Até a amargura passar
Ninguém precisa da tristeza
Ninguém precisa da dor
Eu odeio ver você
Andando aí fora
Aí fora na chuva
Então não me castigue
Ou pense que eu, eu te ofendi
Como aqueles que te levam
E te fazem sofrer
Muito longe
Guns N Roses
sábado, 16 de novembro de 2013
quarta-feira, 13 de novembro de 2013
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So I kiss goodbye to every little ounce of pain
Light a cigarette and wish the world away
I got out, I got out, I'm alive and I'm here to stay
So I hold two fingers up to yesterday
Light a cigarette and smoke it all away
I got out, I got out, I'm alive and I'm here to stay
Jake Bugg
sábado, 9 de novembro de 2013
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“No início você briga, chora, faz drama mexicano. Então percebe que é cansativo demais manter esse jeito de levar as coisas. Acostuma-se… Não que pare de doer, mas que cai no seu entendimento que às vezes perdemos algo e não há solução. No fim você coloca um sorriso no rosto e finge que é sincero, até que a vida o faça realmente ser. Talvez os amores eternos sejam amenos e os intensos, passageiros. É isso.”
Caio Fernando Abreu
segunda-feira, 4 de novembro de 2013
Tennessee
Fagulhas presas se desprendem facilmente pelo ar
Tudo se desprende
O que vejo é fosco
Como um filme em preto e branco
Não há romance
O romance acabou nos ultimos cento e vinte minutos
Cento e vinte minutos mal focados em cenas confusas, difusas
Me deixaram ver através da janela
E depois eles a fecharam
Como algo ilimitado
Eles me venderam o produto falso
Por trás de uma propaganda recheada de sonhos bonitos, vestidos bem cortados
Trejeitos elegantes
Mas eu nem sei se quer o que a elegância convém
Comprei mesmo assim: onde assino?
Disseram que eu poderia ir para Tennessee no verão que vem
Eu nem sei onde fica, reservei as passagens mesmo assim
Me deram um aperto de mãos e fugiram com meu sobrenome rabiscado em preto no papel branco
Genial
Tennessee ficou para o próximo e próximo verão
Depois deste, que nem começou
Romances de revista
Romance por toda parte
Nas novelas e nos outdoors
O romance é bonito, eles te fazem pensar
E só gente bonita é que pode amar
Romance é a droga mais vendida
E eu nem se quer vi os campos verdes, o céu azul pastoso
Eu nem coloquei os pés
Em Tennessee
Annabel Laurino
sexta-feira, 1 de novembro de 2013
Ventania
Novembro está ai. Chegou batendo forte nas janelas com esse vento todo assoprando a seco e levando tudo. Trazendo tudo também. Veio socando as paredes de concreto das casas, arrebentando árvores, desfazendo varais de roupa, balançando fios elétricos e levantando poeira por todo lado. Forte, destemido. Os ventos vem e vão. E são esses mesmos ventos de novembro que assomam agora lá fora, que trazem coisas que eu tentei esquecer o ano todo. Que eu fingi esquecer, pelo menos.
Novembro é sempre assim. Teimoso. Indeciso. Com um pé no inverno e o outro no verão. Como dizia Martha Medeiros, apego ao passado e desesperado pelo novo. E de novo posso ver o ano que vem a frente assim que dezembro chegar e logo logo acabar. E dessa vez o que Novembro me traz é as lembranças antigas de coisas que aconteceram e marcaram. Sim, o gosto bom do que ficou, daquilo que já foi e não volta. Não tem como voltar.
Como lei a gente sabe lá no fundo que tudo sempre vai, sempre se vai. E dessa vez a esperança é que algo também se vá. Que Novembro leve consigo nessas ventanias a solta todas as mesmices e más lembranças, que já não me servem mais.
É noite fria lá fora e o vento arromba as portas sem pedir licença, sem medir espaço. É frio, vento frio daqueles que exige um casaco, um agasalho, que levanta os cabelinhos dos braços e faz a gente se encolher. Um café, eu digo, noites daquelas que se precisa de uma companhia quente de um café forte.
Envolta em lembranças, difundo minha mente numa busca desesperada para me ver livre do passado, ao mesmo tempo em que mergulho novamente nas minhas memórias secretas e escondias e chafurdo mais uma vez numa espécie de nostalgia, tal qual só eu mesma reconheço. Fico como se degustando uma bala na boca lentamente, retirando o gosto bom que a bala tem. Mas ela nunca acaba.
Além do que já se foi me pergunto o que virá. O que Novembro me reserva agora? O que vem por ai junto com os seus ventos tempestuosos de céu escuro e muita chuva?
Ainda não sei. Desperto a mim mesma nessa vontade, nessa curiosidade do que o futuro pode fazer por aqui, das suas travessuras e brincadeiras, das trapaças de vida que sempre pulam pra fora nos surpreendendo.
Ah Novembro... Seja bem vindo, pelo menos.
Novembro é sempre assim. Teimoso. Indeciso. Com um pé no inverno e o outro no verão. Como dizia Martha Medeiros, apego ao passado e desesperado pelo novo. E de novo posso ver o ano que vem a frente assim que dezembro chegar e logo logo acabar. E dessa vez o que Novembro me traz é as lembranças antigas de coisas que aconteceram e marcaram. Sim, o gosto bom do que ficou, daquilo que já foi e não volta. Não tem como voltar.
Como lei a gente sabe lá no fundo que tudo sempre vai, sempre se vai. E dessa vez a esperança é que algo também se vá. Que Novembro leve consigo nessas ventanias a solta todas as mesmices e más lembranças, que já não me servem mais.
É noite fria lá fora e o vento arromba as portas sem pedir licença, sem medir espaço. É frio, vento frio daqueles que exige um casaco, um agasalho, que levanta os cabelinhos dos braços e faz a gente se encolher. Um café, eu digo, noites daquelas que se precisa de uma companhia quente de um café forte.
Envolta em lembranças, difundo minha mente numa busca desesperada para me ver livre do passado, ao mesmo tempo em que mergulho novamente nas minhas memórias secretas e escondias e chafurdo mais uma vez numa espécie de nostalgia, tal qual só eu mesma reconheço. Fico como se degustando uma bala na boca lentamente, retirando o gosto bom que a bala tem. Mas ela nunca acaba.
Além do que já se foi me pergunto o que virá. O que Novembro me reserva agora? O que vem por ai junto com os seus ventos tempestuosos de céu escuro e muita chuva?
Ainda não sei. Desperto a mim mesma nessa vontade, nessa curiosidade do que o futuro pode fazer por aqui, das suas travessuras e brincadeiras, das trapaças de vida que sempre pulam pra fora nos surpreendendo.
Ah Novembro... Seja bem vindo, pelo menos.
Annabel Laurino
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