Tamborilou nervosa na tampa da mesa de vidro. As unhas
tingidas de rosa choque fazendo uma melodia agonizante. Bufou o ar pelos lábios
crispados, olhou aflita para fora da janela suja e empoeirada, passou a mão
pelos cabelos bagunçados e em desordem, os bagunçando ainda mais.
- Pare por favor, está me deixando nervosa só de lhe
observar.
- Não tenho culpa.
- Na verdade tem.
Ela baixou os ombros sentindo-se cansada, vazia, culpada.
- Talvez eu tenha então.
- Claro que você tem.
Olhou seu reflexo meio distorcido no vidro da janela. Sentia-se
boba, ali, sentada, naquela hora da noite, perdida em um sábado qualquer,
buscando qualquer coisa que a mostrasse uma direção que pudesse servir de
consolo, enquanto fugia das essenciais respostas que tentava evitar a muito
tempo. Analisou a linha dos cabelos, os fios em disparate, os olhos enérgicos
atrás dos óculos, a boca pequena torcida numa feição mais que aflita.
Suspirou mais uma
vez.
- Talvez seja culpa
minha mesmo... Talvez não, é minha culpa. Tentei fazer uma coisa nitidamente impossível
acontecer, só por que sou fria e ridiculamente egoísta, não prestei atenção nos
sinais claros de que tudo isso não daria certo.
[silêncio]
- Não sei o que
fazer. – sentenciou, confiando ao silêncio ambíguo do lugar, a dentro de si
mesma, uma verdade retumbante.
- Eu muito menos.
- Mas você precisa me
ajudar. Precisa me dizer o que acha.
- Acho que você está
louca. Acho que você tem problemas, sei lá. Eu não poderia ajudá-la, mas um
especialista talvez. Não me leve a mal, mas quero terminar esse meu bom drink descansadamente.
- Você quer é me
fazer chorar.
- Você não choraria.
- Está sendo
cruel...
- Estou sendo
realista.
- Acho que devo ir
embora.
- Lá vem você outra
vez...
- Falo sério. A
melhor coisa a fazer agora, talvez, seria sumir por uns tempos. Amenizaria
danos.
- Não, você
prolongaria o tempo dos danos acontecerem.
- Você está vendo de
uma forma errada.
- Conte-me mais
senhorita “preciso fugir”
- Não é fugir. É só
acabar com tudo de uma vez, vai doer muito, mas não machuco mais ninguém.
- Ah.
- Olhe para mim, eu
nem sou bonita, sou só uma mulher carente, iludida, criança, mimada, sem coração
e mortalmente cruel. Não tenho nada a oferecer a ninguém. Estou vendo-me muito
claramente agora, e tudo que eu vejo não me agrada. – encarou-se na tampa de
vidro frio da mesa, seu reflexo batia contra a luz do abajur ao lado e
refestelava em seus olhos. Não a agradava.
- Você tem problemas.
- Eu sou o problema.
- Tome um drink.
- Não sou segura bêbada.
- Eu te asseguro de
qualquer coisa, bebe, deixa de ser chata.
- Preciso ir embora.
Dispensou o drink. Dispensou
mais um olhar aflito ao seu próprio reflexo no tampo da mesa, dispensou a
cantada do cara mais velho da mesa ao lado, levantou-se deixando a mesa que
estava vazia, juntou a bolsa e disparou para a porta. Iria embora.
Annabel Laurino