segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Ela mesma.


    E todo dia quando acordava ela se lembrava daquele gosto bom de café, apalpava o corpo com as mãos de unhas tingidas de preto e depois bagunçava o cabelo adornado de mechas loiras e brancas. Era uma incógnita ambulante. Uma parafernália gritante e profundamente confusa que poucos sabiam manejar. Ela se estendia, se espreguiçava, colava e partia, sem dar a menor explicação para ninguém. Nem ela mesma se entendia. Nunca soube ser bonita, charmosa, se achar gostosa ou dar uma de esperta, nunca soube ser nerd, esquisita, ou metida. Mimada, até podia ser. Sabia que era. Mas preferia dizer que não era mimada, simplesmente era persistente, corria atrás do que queria por que sabia o que queria. Quando sabia. Geralmente nunca sabia, mas nas poucas vezes, era uma total guerreira. Retirava as adagas, levantava bandeiras, inventava urros de guerra e saia para a peleja. Ela era estranha, louca ou anormal. Algo do tipo. As pessoas nunca a entendiam, ela amava errado, gostava das coisas mais esquisitas. Como dias de chuvas, sair na chuva, molhar o cabelo, folhas secas, frio, ventos fortes, carros antigos, meias, livros, e tirar fotos sem nexo. Escrever poesias, falar com cachorros, brincar com crianças, fazer listas de afazeres, cheirar livros, segundas-feiras, escutar música, jogar jogos, amar, beijar... Era uma total... Total ela mesma. E até então, todos os dias que acordava, mesmo sabendo que ninguém a compreendia, e nem compreenderia, a única coisa que lhe servia e que desejava ardentemente era uma boa e deliciosa xícara de café, daquelas com o café forte, cheiroso e fervente. Ela se servia muito bem de só isso. Por que lhe bastava começar o dia assim, sendo ela mesma.


Annabel Laurino.

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