sábado, 12 de março de 2011

Afundando e Emergindo

    Um clarão, não tão forte como o brilho de lanternas de um carro no escuro. Não.
    Mas um clarão, de fato. Como uma bandeira de brilhos tremeluzindo diante do meu corpo presente que afunda. Afunda.
    Estou afundando agora. Outra hora, estou emergindo.
    Afundando e emergindo.
    Estou sentindo, o liquido se espalhando pelo meu corpo como uma caricia de véu, as lambidas aguadas egeladas que logo vão ficando mornas, me envolvendo.
    Adentrando meus ouvidos, minhas narinas, me encharcando por inteiro.
    Sou apenas um corpo presente no meio de tanto mar. Sou apenas um corpo.
    Afundando e emergindo.
    O sal do mar gradativamente gruda em minha pele como algodão encostado em tecido.
    Não há som.
    Nada.
    Sou só um corpo.
    Não há nem barulho de vento, nem de vozes. Nada.
    Como entrar em um quarto de água. Não se ouve nada.
    Quase e ainda praticamente imperceptível ouço as ondas quebrando acima de mim. 
    Ouço a maresia, o som  caustico e fervilhante, borbulhante e inebriante. Como um cântico celestial, como areia se remexendo em um tudo de vidro, de pés se arrastando ao chão lentamente, corpos se unindo, é tudo que eu consigo ouvir, e ainda assim tão silenciosamente como se de repente, eu não existisse. Como se tudo ficasse fora daquela pequena camada plástica que encobre a água, a tensão superficial. Como se dali em diante, adentrando eu não fosse nada mais.
    Um corpo.
    Afundando e emergindo.
    Eu vejo as luzes do sol entrando pela água, partículas de brilho se unindo ao verde vivo do mar.
    Eu sinto você chegar, chegando lentamente, sinto seu toque, quente preciso, sua mão macia afagando meu ombro. Posso ouvir até a sua voz, talvez por que escutei ela ontem no telefone, talvez por que ela já ficou em mim, e já faz muito tempo que muita coisa sua esta em mim.
    Sua voz se arrasta em meus ouvidos como o sal do mar se arrasta nas ondas, como uma espuma branca que quebra na maresia, arrastando-se. Segundos eternos.
    Meu nome, você diz meu nome. E tudo que eu quero é agarrar você, agarrar seus braços e puxa-lo para perto de mim até fazer com que tudo seja real, quero suplicar para que me retire de dentro da imensidão funda e superficial pela qual me encaixo sendo a cada segundo emergida. Quero gritar seu nome no meio da água. Desesperadamente. Inocentemente.
    Pobre de mim.
    Então o ar me falta assim, tão de repente, e como um impulso de sobrevivência já não posso mais emergir dentro do mar, e volto. Volto para o ar. Uma realidade me sucumbindo.
    Quase choro.
    Sons. O vento. As vozes, as risadas, as buzinas, as musicas, os outros seres presentes.
    Ah que pena.
    Você não está mais aqui.

    Encho os pulmões novamente. Tranquilamente, emergindo novamente sou engolfada de novo em um mundo de água, silêncio e calor.
    E novamente, os sentidos quase desfalecidos me encobrem rapidamente.
    O sol, a areia, as ondas, os corpos.
    Tão de repente, subitamente, já posso sentir você aqui. Você em mim.


Annabel Laurino.

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