quarta-feira, 4 de abril de 2012

Insaciedade Medrosa


Parece um tanto sem graça no começo. Eu sei. Afinal, o que se pode haver de tão atraente e delicioso em um copo d’água sem nenhum cubo de gelo enfeitando-o graciosamente? E, conforme dita a física e a química, nele não ocorrem aquelas gotículas decaindo sobre o vidro frio do copo, com uma poça pequenina e sem vida por baixo, o acumulo de todas aquelas gotículas geladas. Não. Não há gotículas nesse copo, apenas um canudo branco de listras rosas dependurado e retorcido pelo bocal do copo em aparência demasiada abandonada, quase intocável. Compreensível que nada de atraente você veja nisso, nessa cena auspiciosa de um copo solitário repousando por cima de uma mesa velha, sem gotículas ou pequenina poça de gotículas geladas ao fundo e nem mesmo cubinhos de gelo, e sim, apenas um retórico e contraditório canudo branco com listras cor de rosa. Cheio, o copo cheio quase transbordante. De fácil acesso, a água que contém ali, com toda aquela coisa que a água faz, beijando o bocal silenciosamente, tenho sede. Sim, uma sede incansável de me esquecer de mim e beijar a água, encostar os lábios no canudo branco e chupar dele toda essa água, esse toque de água. Mas contenho-me afável. Tenho medo do que pode acontecer, se vou conseguir parar depois. Como posso fazer? Sou insaciável, digo, e me vejo aqui, nesse momento dispersivo de pouca fé, com uma gula imensa sobre algo, digamos assim, não atraente para os olhares alheios. Eu, porém, quase me sinto gritar com essa cena. Me vejo nela, veja só. É como se o copo, o lindo copo bojudo de vidro gélido fosse um sistema funcional acoplado dos acontecimentos recentes, você perguntaria “o tempo?” e eu responderia com um aceno fiel, “sim, o tempo”, e então o canudo sendo eu, em minha coragem destemida que me falta sã, a roupa da coragem, sim, por que para provar da água é necessário o canudo, como uma rota, ele ligaria-me a água, e sem coragem, não há o que conseguir ter. E veja só, a água enfim seria ele, por que não? Então percebes que o copo me traz a água e a água me tenta com um canudo flutuante do qual sem ele não posso provar d’água. Claro, como menina travessa, pensei em encostar meus lábios no bocal do copo, mas seria de tamanha gula e não é assim que me apresenta tal. Preciso reunir algo para chegar a coragem e ainda não o sei o bem. Como posso fazê-lo? Teria então que ir com delicadeza, sutileza e com carinho, amor, afeto e etc. afins que intermináveis me faltam nos bolsos? Pois então estou perdida, sem a coragem não consigo entrar nessa. Ou no copo, ou na água, agora tanto faz.



Annabel Laurino.

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