De repente deu uma
vontade. Uma vontade de estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Qualquer
deles. Nem mesmo que fosse lugares, mas momentos.
Aqui, sentada na
minha típica cadeira do quarto, a luz apagada, são oito da noite, acabei de
chegar, as luzes do dia estão fracas, mais um dia dando adeus. Tudo começa a
ser substituído. O arroxeado no céu, a ventania que paira sobre os cubes das
arvores mais altas, o vento sacudindo as flores nas arvores fazendo-as
despencar docemente, as aves cortando o céu, o mundo, lá fora. Tão fora. E aqui
dentro fica esse silencio que só é cortado por esse música que toca
insanamente. Ao meu lado uma revista antiga de Nova York. Folheio cansativamente,
o ar de quem deixou muito cair no chão e não há mais forças para pegar nada.
Mas eu junto forças, folheio as paginas, e choro, olho novamente para fora da
janela. Essa tela grande que estampa o mundo real lá fora. Se me perguntasse o
que eu vejo talvez não seria muito bem a resposta esperada. Não são bem
plantas, é vida crescente tingida de verde que respira constantemente e que
exclama “ar”, não são telhados úmidos, são telas solares onde as aves pousam de
seus vôos rasantes, não são flores, são botões que vestem as copas de arvores
mais prestigiosas e que por uma benção divina ficam aqui na minha janela todos
os dias, e todos os dias quando acordo, abro as janelas e respiro, “ah
sim...". Talvez eu esteja mesmo em alguns lugares por ai. Como agora, nesse exato
momento. Estou me imaginando longe, estou bifurcando na musica, no negro do
café, e nas aves, no arroxeado do céu sendo borrifado de um alaranjado mudo.
Mas continuo aqui, dentro dessa caixa colorida onde anoto tudo e vivo, mesmo
que viva em palavras, em pontos e em virgulas, mas eu vivo. É anotando que se
sente. Não é assim com você?
Annabel Laurino.
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