E eu aqui idealizando a vida. Ainda penso que toda essa
idealização acaba um dia. Até o dia de eu despertar de verdade, como se
houvesse por trás dessas durezas todas, dessa forma de agir macio e encarado,
alguma data de validade para toda essa velhice antes da hora.
Me surpreendo
olhando no espelho, vendo um corpo, um rosto, tão jovens. Parece que faz tanto
tempo que estou aqui, dentro destes. As feições do rosto e os gestos deste
corpo sempre repetitivos, tão memorizados pela memória.
As vezes, tão
solitária dentro e fora. As vezes tão mais dentro do que fora e as vezes por
fora, tão angustiante.
A falta que faz um
corpo ao lado durante as matizes de um dia frio, nem me fale. Fico enrolando
historinhas, preenchendo lacunas com coisas bobinhas, encontros inesperados, coisas que possam acontecer e que nunca acontecem.
Um tipo de tédio
desprezível vem e me abraça por trás. Quase sempre me pergunto por que desse
motivo de estar aqui. É verdade sim que me encanto por quase tudo, que as luzes
e toda essa beleza da vida me chama muita a atenção, que é tentadora a esses
olhos curiosos de criança pequena, agarrar em suas
mãozinhas minúsculas que tudo quer pegar e entender como funciona.
E é dessa forma
que ajo com o amor, ou o que eu penso ser amor. Com relacionamentos então, só
para ficar melhor. Eu acho que me interesso tanto pelas engrenagens diferentes
que fico tentada a saber como funciona, mergulho de cabeça, arremesso as mangas
e começo o projeto de descobrimento e então, quando descubro, eu acho tudo tão
relativamente simples que vou embora. Procuro outras engrenagens para decifrar.
Procurando o indecifrável, alguma surpresa, sugando da vida o que a vida dá.
É estranho. Acho
que ainda não estou pronta para qualquer coisa relativamente grande que a vida
possa me lançar. Mas as vezes penso que toda essa velhice impede um pouco de
ser feliz. Queria tanto agir bobinha, rir de coisas idiotas, não ler tanto, não
idealizar tanto, namorar no banco de uma praça no domingo a tarde e usar o
moletom do namorado achando ser a coisa mais legal do mundo.
Mas não dá. Não
consigo.
É nesse momento
que a fina linha de pensamento chega ao fim. Eu, essa prova viva de engrenagem
não decifrada que me pego olhando duvidosamente todos os dias, na sede de me
decifrar. De enjoar de mim mesma, de perder a graça, não sentir mais gosto
algum. Porém, como esperançosa fiel que todos somos, embosco um sorriso nos
lábios ao melhor estilo Monalisa e tudo bem, o dolorido do incompleto pode ser
disfarçado.
E no fim, me
pergunto até quando.
Annabel Laurino.
Nenhum comentário:
Postar um comentário